Luiz e a Natureza

IGREJA DO DIVINO
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Igreja: Comunidade terapêutica divindade natureza

Dr. Luiz Carlos Mendes Pedroso - "Luiz Natureza-" 

Por um modelo voltado para a integralidade e o crescimento do ser humano INTRODUÇÃO
Um dos grandes desafios que temos pela frente é viver bem nesta sociedade denominada pelos estudiosos de pós-moderna. Algumas de suas características peculiares como competitividade, consumismo, utilitarismo, agressividade, perda de valores absolutos, relativização da verdade, etc., têm gerado indivíduos enfermos do ponto de vista da alma e dos relacionamentos.
Somos uma sociedade enferma. Que desaprendeu a amar, que estabeleceu a desconfiança como condição “sine qua non” na relação pessoal, que não sabe mais desenvolver relacionamentos saudáveis e profundos, que vive deprimida e angustiada, que perdeu a dimensão da comunidade e solidariedade, dando lugar a um estilo de vida egoísta, que não sabe mais construir pontes de comunicação que levem ao encontro do outro para a celebração da vida em verdade e em amor. A igreja na sociedade pós-moderna também está enferma. Na ânsia de crescer numérica e financeiramente começou a priorizar os grandes projetos e as realizações de mega eventos, deixando de lado a importância dos relacionamentos. Tornou-se uma igreja realizadora, mas pouco relacional. Como conseqüência, suas reuniões tornaram-se superficiais, sendo mais uma oportunidade para consumo de artigos religiosos e menos oportunidade para relacionamentos que possam curar as feridas e gerar vida em abundância. As manifestações solidárias do Corpo de Cristo que expressavam preocupação pelo outro deram lugar à busca egoísta pelas bênçãos especiais e imediatas, as quais normalmente são entendidas como bem estar emocional e prosperidade material. De um modo geral as igrejas perderam a visão de sua vocação como comunidade terapêutica. Deixaram de desenvolver programas que priorizem e facilitem relacionamentos, que ajudam no desenvolvimento da potencialidade de seus membros, que busquem a integralidade de cada um.
É justamente sob esta preocupação que fomos motivados a escrever este trabalho. Depois de onze anos no pastorado é mais forte ainda a convicção de que as igrejas relevantes deste século serão aquelas que tiverem como filosofia de ministério o objetivo de se desenvolverem como comunidade terapêutica, como parte de sua missão integral. Igrejas relacionais farão a diferença nesta geração. O propósito deste trabalho é oferecer uma reflexão sobre a vocação terapêutica da igreja, a partir da necessidade de saúde integral de todo ser humano. Procuraremos mostrar que as conseqüências da desintegração/separação impostas ao ser humano a partir da queda pode ser restaurada à medida que a igreja desenvolve programas que enriqueçam os relacionamentos e promovam cura. Veremos que o ministério de Jesus foi um ministério de sanidade, à medida que promovia cura e salvação ao mesmo tempo, restaurando indivíduos em sua integralidade. Finalmente, e esta talvez seja a parte mais importante deste trabalho, iremos refletir sobre o papel do pastor na transformação de uma igreja local em comunidade terapêutica. Veremos a relevância do ministério pastoral equipando a igreja para a sua missão de gerar cura para a nossa sociedade pós-moderna. Esperamos que este trabalho de caráter essencialmente prático possa encorajar e ajudar outros a desenvolverem uma filosofia de ministério que priorize a igreja como comunidade do relacionamento.

2 – QUEM SOMOS NÓS – UM PERFIL DA NOSSA SOCIEDADE
A nossa sociedade pós-moderna apresenta muitos desafios para o ser humano neste novo século.
As características de uma sociedade utilitarista e acumuladora de bens têm levado indivíduos e famílias inteiras a fazer novas opções de valores, prioridades e estilo de vida. Não só isso, mas também a uma série de conseqüências que atingem diretamente a vida humana. Gostaríamos de tentar traçar um perfil da sociedade em que vivemos e, conseqüentemente, daqueles que fazer parte da comunidade cristã, denominada igreja.

Solidão: As pessoas vivem sós no contexto urbano atual. Muitas têm imensa dificuldade em compartilhar suas vidas, temores e angústias. Apesar de necessitarem e até desejarem relacionamentos profundos, não conseguem romper com as barreiras e ir ao encontro do outro. Permanecem assim como uma ilha, mesmo em meio a um sem número de pessoas. Buscam resolver sozinhas seus próprios conflitos e tentam satisfazer a si próprios. O problema é que sozinho o indivíduo se torna mais vulnerável, fragilizado e na busca por satisfação pessoal ele encontrará mais angústia. Numa era tecnológica como a que estamos vivendo, de rápida e fácil comunicação com o mundo, as pessoas ainda vivem o drama de se sentirem solitárias.
Competição: Nossa sociedade assumidamente capitalista e consumista tem gerado um conceito utilitarista das pessoas, fazendo-as crer que só terão valor se possuírem bens e estiverem participando da produção de outros bens. O valor passa a ser no que se tem e não no que se é como pessoa. Em função disso, as pessoas se tornam altamente competitivas, desconfiadas em seus relacionamentos, vendo o outro como franco adversário. Logicamente, tal postura levou o ser humano a um isolamento planejado e destruidor, gerando um estilo egoísta de viver somado à atitudes nada humanas do ponto de vista da bondade e da generosidade para com o outro.
Descartabilidade: Numa sociedade consumista as pessoas se tornam descartáveis à medida que não conseguem produzir bens como antes. Tornam-se inaptas para o grande mercado. A idéia da descartabilidade gera um sentimento de desvalor e inutilidade existencial, o qual desemboca em angústias, depressões e outras enfermidades da alma. Nesse ponto, a maior necessidade do indivíduo é sentir-se capacitado e qualificado para viver com propósitos, desenvolvendo relacionamentos significativos. Padrões errados de comportamento: Não é raro encontrarmos no aconselhamento pastoral pessoas honestas que lutam contra padrões inadequados de comportamento que adquiriram na infância por modelos ruins, os quais desembocam em alguns desvios, como práticas sexuais distorcidas, no hábito de mentir, dificuldade de desenvolver relacionamentos profundos e saudáveis, dificuldade em amar e ser amado, vícios, reações extremamente negativas, temperamento de difícil convivência, caráter falho, etc. São as enfermidades que muitos tentam esconder ou racionalizar como se fosse algo normal.
Traumas interiores: Pessoas que não foram amadas quando pequenas, sentimentos de rejeição, crítica excessiva por parte dos pais, disciplina violenta, abuso sexual, lares desajustados, são algumas das situações que fazem as pessoas se sentirem presas a um passado triste e opressor, que as paralisa, bloqueando todo seu potencial de crescimento. Tais pessoas gastam grande parte do seu tempo e energia tentando administrar seus traumas interiores, ficando assim sem energia para buscar o crescimento pessoal. Medos/Temores/Ansiedade: Vivemos no século da ansiedade e de todos os tipos de medo. Nunca se consumiu tantos tranqüilizantes como antes, mesmo entre a população mais jovem. É grande o número de pessoas que precisam lidar diariamente com seus medos e inseguranças, desde os mais simples e insignificantes até aqueles mais assustadores. O medo da morte, do desemprego, da doença, da perda da família, de ficar sem dinheiro, de ser assaltado, de ser rejeitado, são alguns exemplos de medos que tomam conta da nossa sociedade hoje.
Desintegração familiar: Já é sabido que a família não desempenha mais um papel central em nossa sociedade e nem é vista com a mesma importância de antes.

Isso não diminui, no entanto, o caráter integrador da família na vida de qualquer pessoa, sendo a instituição que ensina limites, forma o caráter, gera o senso de pertencer, dá identidade e equilíbrio emocional ao indivíduo. Mas o que se vê, porém, são pessoas vivendo sob o mesmo teto, sem compartilhar suas vidas e seus sentimentos mais profundos. Poderíamos destacar ainda outras características da nossa sociedade pós-moderna e suas conseqüências para os nossos dias. No entanto, nosso objetivo é mostrar que as características acima apresentadas são nada mais que expressões do pecado na vida humana, os quais por sua vez levam a uma desintegração do ser.Para aprofundarmos esta questão tentaremos no próximo ponto definir alguns conceitos importantes do ponto de vista bíblico e teológico, a fim de enriquecer nossa reflexão.

3 – SAÚDE INTEGRAL: UMA ANÁLISE BÍBLICO-TEOLÓGICA

Ao tratarmos desse assunto, contamos com as anotações de Larry Crabb (1998, p.42) o qual faz uma análise teológica muito interessante. A partir da noção de pecado como resultado da separação, sugere o autor que existe na experiência humana a realidade de quatro separações: separação de Deus (problemas espirituais), separação dos outros seres humanos (problemas sociais e de relacionamentos interpessoais), separação da natureza (problemas ecológicos e físicos) e separação de si mesmo (problemas psicológicos). Podemos dizer que os cristãos que vivem em comunidade tiveram resolvido o problema da primeira separação – a de Deus – no entanto ainda existem algumas a serem superadas. A chave hermenêutica para entendermos este processo de enfermização do ser humano é justamente o cenário da queda. Entender esta questão, segundo Uriel Heckert, “é muito importante para entender-se a situação atual da humanidade e de cada um de nós. Está aí a raiz de toda ambivalência e inautenticidade que experimentamos”. (1985, p.12).
A partir da queda de Adão e Eva um processo de desintegração tomou conta do ser humano. Até então ele vivia em perfeita harmonia com seu Criador, com o outro ser humano e consigo mesmo. Podemos dizer que ele gozava de saúde plena, já que havia esta integração completa entre criatura-Criador, criatura-criatura, criatura-natureza. O Dr. Zandrino nos diz que tal integração era perfeita e perceptível na ausência dos dois principais sintomas de enfermidade: a dor – sintoma de enfermidade física e o medo – sintoma de enfermidade psíquica (1986, p. 31).
O pecado trouxe conseqüências desastrosas concretas para o ser humano. “A desobediência do primeiro homem trouxe como conseqüência morte espiritual ou separação de Deus, o que também inclui morte física, que por sua vez também está relacionada com enfermidade, dor e perda da vida” (op.cit., p.38).
A enfermidade tem uma relação direta de causa e efeito com o pecado, o qual agiu como fator de desestabilização do ser humano. A opção do ser humano em buscar sua autonomia e tornar-se o centro do universo fez dele um ser rebelado, enquanto negava sua condição de dependência de Deus negava também a razão de sua própria existência. Abre-se então o caminho para o pecado e o ser humano passa a viver um estilo de vida errando continuamente o alvo para o qual foi criado: a plenitude da comunhão com Deus. Como conseqüência ele se vê agora separado do seu Criador, separado do outro, e em crise consigo mesmo. Separado de Deus, do outro e de si mesmo, o ser humano se viu enfermado do ponto de vista de sua existência, do sentido e propósito de vida. Desse modo, estar vivo é experimentar diariamente a dor e o peso da enfermidade.
O plano redentor de Deus, por sua vez, objetiva trazer de volta o ser humano ao seu estado original de integridade. Tal plano de redenção que encontramos em toda a Palavra de Deus inclui, ora salvação, ora cura para as enfermidades físicas. A saúde integral, portanto, tem a ver com a plenitude da vida humana, no nível individual e coletivo, nas ralações harmoniosas e amorosas com Deus, com outros e com a natureza. Se alguém perguntasse a resposta de Deus ao pecado, a resposta seria: salvação e saúde. Se perguntasse a respeito da resposta de Deus à enfermidade, a resposta seria: salvação e saúde também! O conceito de saúde da Organização Mundial de Saúde é: “um estado de completo bem estar físico, mental e social”. No entanto, Uriel Heckert, citando Kingma, sugere um conceito cristão: “Saúde é um estado dinâmico de bem estar do indivíduo e da sociedade; um bem estar físico, mental, espiritual, econômico, político e social; em harmonia com os outros, com o meio ambiente e com Deus”. (1985, pp.12-16). Tal conceito amplia a idéia de saúde como algo que transcende a experiência humana individual e alcança uma dimensão coletiva, ecológica e espiritual. É interessante quando analisamos alguns termos bíblicos relacionados, em sua raiz, à mesma idéia. “Shalom” : expressa, além de ‘paz’, também ‘saúde’ num sentido bem amplo, ‘renovação espiritual’, ‘reabilitação social’. Também a palavra “Soteria” – “salvação” no grego, pode indicar ‘totalidade da pessoa’, ou simplesmente ‘saúde’; ou seja, na soteriologia de Deus não está contemplada apenas a dimensão espiritual, senão também a totalidade do ser humano.
Como exemplo bíblico podemos citar a expressão “a tua fé te salvou”, pronunciada por Jesus no evangelho de Lucas. A mesma aparece quatro vezes em Lucas: em 8:48 = mulher curada de hemorragia; em 17:19= a cura dos dez leprosos; em 18:42 = a cura da cegueira de Bartimeu; mas em 7:50 = perdão dos pecados da mulher. Na verdade esta separação entre saúde e salvação que encontramos em nossa teologia é algo que faz parte apenas da nossa mentalidade ocidental, a qual adotou o dualismo grego da matéria e do espírito em sua filosofia e cosmovisão. Para o médico e teólogo Anthony Allen o prejuízo desta opção é imenso, pois com isso “de uma só tacada tanto ‘saúde’ como ‘salvação’ deixaram de ter seu verdadeiro significado! Este dualismo prejudicou o cuidado integral da pessoa pelos serviços médicos. Também minou a missão declarada da espiritualidade em geral, e da igreja em particular, de proclamar e facilitar a verdadeira ‘salvação’ de pessoas.” (1998, p.27).
Na prática, para a visão dualista ocidental os conceitos de pecado e salvação foram “espiritualizados e moralizados. A salvação foi relegada a um cenário forense ou judicial(…)salvação do pecado envolve nada mais do que arrependimento, perdão, punição vicária, transformação moral e a busca da perfeição moral (santidade)” (op.cit, p.29). Allen termina dizendo que “a salvação das escrituras é transformadora. Na bíblia, ser salvo significa ser transformado(…)cura é transformação total; então, salvação e cura são uma e a mesma coisa” (op.cit., p.30). Da mesma forma, Jaques Ellul, citado por Ricardo Zandrino diz: “a cura é juntamente corporal e espiritual. Cura e salvação são conceitos associados com freqüência” (1986, p.38) Saúde e salvação, portanto, são termos superpostos e paralelos na teologia bíblica da redenção. A teologia da salvação está certamente ligada à teologia da saúde!
4 – A IGREJA – DE SEUS DRAMAS À COMUNIDADE TERAPÊUTICA

Lembro-me de ter lido certa vez a respeito da igreja como sendo uma grande embarcação em alto mar, que vai resgatando muitos náufragos à medida que vai cortando o oceano. Pessoas que estavam morrendo afogadas têm assim a possibilidade de serem resgatadas da morte trágica. Sendo assim, aquele se torna o navio dos ex-náufragos, habitado por pessoas que têm viva na memória a lembrança do seu salvamento, enquanto o navio continua sua missão de resgatar vidas. No entanto, poderíamos dizer que esta é apenas parte do trabalho de resgate. Há um outro aspecto quanto aos resgatados que envolve seus ferimentos, lembranças infelizes, hematomas, fraturas, incapacidade para viver aquela nova situação, sofrimentos que precisam de cura…. Esta ilustração nos faz entender que a igreja é um lugar de pessoas salvas do pecado, mas que ainda carregam as conseqüências nefastas das expressões do pecado em suas vidas. São distorções da personalidade por causa de uma má formação infantil, hábitos prejudiciais, patologias, sintomas psicológicos, padrões de comportamento inadequados, e uma série de fatores que levam os indivíduos a reconhecerem que, embora resgatados por Deus, ainda precisam de cura. Usando uma expressão teológica: “foram salvos, mas continuam sendo salvos a cada dia”. Após traçar o perfil para entender nossa sociedade e conhecer as características daqueles que se chegam para nossa comunidade, precisamos pensar em como a igreja os recebe, ou então, no tipo de ambiente que eles encontram. Via de regra, as igrejas não estão preparadas para receber as pessoas (os ex-náufragos) como comunidade de cura e geradora de saúde integral. Se por um lado as pessoas chegam procurando um ambiente de amor, aceitação e cura para seus dramas, por outro lado encontramos muitas comunidades legalistas, rigorosas e de relacionamentos superficiais, o que de fato não ajuda em nada no estabelecimento de um ambiente propício para se abrirem à cura de Deus. No entanto, entre muitas vocações, uma das que a igreja possui é a de ser comunidade terapêutica. No seu livro, “Curar também é tarefa da igreja”, o argentino Ricardo Zandrino deixa bem claro este chamado à comunidade terapêutica que o próprio Deus fez à igreja. A grande chave para entender tal vocação é a imagem bíblica da igreja como Corpo de Cristo, cujos membros são habitados pelo Espírito Santo e dotados de dons espirituais a fim de equipar e preparar os crentes para o serviço e edificar o próprio Corpo. Segundo Collins, “um dos propósitos principais do Corpo de Cristo é ajudar as pessoas (COLLINS: 1990, p.138).
Existem ainda outras imagens bíblicas da igreja que podem potencializar sua missão de ser um centro de cura, libertação, crescimento e potencialização, para o cumprimento de sua missão no mundo: A igreja como Povo de Deus (2Co 6:16) – uma comunidade de cuidado mútuo unida por um pacto com Deus. A igreja como comunidade do Espírito Santo (At 10:44-47) – uma comunidade redentora e curativa, através da qual o Espírito vivo pode atuar num mundo grandemente necessitado (CLINEBELL, 1987, p.61). A igreja se caracteriza portanto como uma comunidade ajudadora, que otimiza o potencial de crescimento de seus membros, proporcionando às pessoas libertação de muitas questões que as impedem de crescer. Ao oferecer um ambiente de comunhão, amor, serviço e crescimento, a igreja estará dando passos no sentido de cumprir sua vocação terapêutica. Nossas necessidades mais profundas deveriam ser supridas na igreja, a partir de relacionamentos saudáveis entre seus membros. Encontramos na Palavra de Deus cerca de 27 mandamentos recíprocos (daqueles que incluem a expressão “uns aos outros” no final). Todos eles têm a ver com o relacionamento, alguns para gerar, outros para proteger, outros para restaurar os relacionamentos. Quando vividos no contexto da igreja local, tais mandamentos produzirão libertação e cura para muitos.
A igreja local é responsável pela saúde integral de seus membros, e não apenas por sua vida espiritual como muitos pensam. É equivocada aquela idéia de que se alguém tem problemas físicos precisa ir ao médico, se problemas psicológicos tem que ir ao psicólogo, se problemas espirituais, precisa ir à igreja. Como já vimos anteriormente, o salvação de Deus alcança o ser humano na sua totalidade e não apenas espiritualmente. A atividade da igreja não pode ser reduzida a um mero exercício cognitivo de aprendizagem intelectual, que a impede de desenvolver um programa de alcance integral do ser humano.

Para a igreja, entender a sua vocação terapêutica é ter a consciência de ser canal da graça curadora de Deus, a qual liberta o indivíduo para uma vida de crescimento e realizações. A igreja de Cristo é, portanto, lugar das muitas manifestações terapêuticas e libertadoras de Deus em relação ao ser humano. São muitos os testemunhos que ouvimos de pessoas que foram curadas do ponto de vista da alma, das emoções, na igreja e pela igreja; pessoas que receberam cura ao serem amadas, aceitas, tocadas, valorizadas. Há que se dizer que a igreja, com todas as suas falhas, tem se tornado a única opção de relacionamentos terapêuticos dentro de uma sociedade secularizada e insensível para com as necessidades do outro. Nossa sociedade sofre de uma grande dificuldade em estabelecer relacionamentos saudáveis e profundos. Poderíamos dizer que mesmo a família, para muitos, já não oferece um ambiente de ajuda e alívio, de modo que as esperanças de muitos vão se canalizando para aquelas igrejas que possuem uma proposta terapêutica de vida em comunidade, que de alguma forma responda às necessidades mais básicas do ser humano. Não seria exagero afirmar, a partir de algumas observações pessoais, que algumas pessoas só recebem um abraço, ou um beijo, na sua comunidade local e em nenhum outro local, sendo que ali tais pessoas se sentem valorizadas e por isso ali permanecem.
Os estudos a respeito da relação membro-igreja nos tem mostrado que os membros permanecem numa determinada igreja local mais pelos relacionamentos e menos pela confissão doutrinária, ainda que esta última tenha a sua importância na vida de qualquer cristão. Em função disso, as igrejas que conseguirem desenvolver um ambiente que gere relacionamentos profundos e saudáveis estarão à frente para se tornarem relevantes nesse mundo pós-moderno. Desenvolver a integralidade humana é o objetivo da igreja. Em razão disso, Clinebell defendeu que “a missão da igreja(…)é ser um centro de vida em abundância, um lugar em que se liberta, sustenta e potencializa vida em toda a sua plenitude, em indivíduos, em relações íntimas e na sociedade e suas instituições”. (op. cit., p.27). A igreja, na sua função terapêutica, precisa desenvolver várias qualidades básicas. Ricardo Zandrino sugere algumas para nossa reflexão (ZANDRINO, 1986, p.67)

1ª) Aceitação – a aceitação é necessidade básica no desenvolvimento da personalidade de qualquer ser humano. É a base do indivíduo. A argumentação bíblica para esta atitude é o fato de que fomos aceitos por Deus em Sua família, através de Cristo. Se na família tal aceitação é importante, na igreja ela possibilita vida e alegria.
2ª) Confissão – trata-se de uma prática pouco desenvolvida na igreja. “A confissão a Deus encarnada no ouvido atento e perdoador do irmão é um recurso poderoso para promover saúde nos membros da igreja”. (op. cit., p.68). O próprio Davi descreveu as conseqüências físicas e emocionais de se carregar pecados sem jamais confessá-los (Salmo 32). A verdadeira confissão gera crescimento e saúde no Corpo de Cristo.
3ª) Perdão – a prática do perdão traz saúde ao indivíduo culpado, senso de libertação e renovação da própria vida. Livra-nos da culpa que paralisa e impede o crescimento para o qual fomos criados. Uma igreja que pratica o perdão ensina a seus membros sobre a graça de Deus de uma forma mais eficaz. Proporciona ao outro um novo recomeço e a possibilidade de tentar mais uma vez. A igreja é o lugar dos recomeços!

4ª) Oração intercessória – orar/interceder por alguém traz saúde a quem quer que seja. Demonstra interesse e valorização, faz-nos aproximar do outro, movidos pela sensibilidade da dor e do sofrimento que alcança pessoas a quem amamos e que estão à nossa volta.
5ª) Contato físico – há uma necessidade de toque físico em cada um de nós. Toque que gera aceitação, manifesta carinho e cuidado. É o toque curador do abraço, do aperto de mão, do braço sobre o ombro do irmão. Há um mistério no contato físico que pode consolar, encorajar, tirar a dor e até mesmo curar.
6ª) Louvor – O ato de louvor expressa atitude contrária à enfermidade. No louvor não há medo, nem recriminação, nem tristeza. “O louvor provém de um coração alegre e de um povo agradecido”. (op. cit., p.76). A ordem bíblica é bem clara: “Cantai ao Senhor um cântico novo” (Salmo 96:1). “Bom é render graças ao Senhor e cantar louvores ao teu nome, ó altíssimo” (Salmo 92:1). “Uma igreja que louva reflete maturidade e saúde e gera saúde e maturidade entre seus membros.” (op.cit., “Está alguém alegre? Cante louvores.” (Tiago 5:13b).

7ª) Outras expressões de serviço – à medida que como membros ajudamos uns aos outros nas mais diversas tarefas, mesmo naquelas pequenas, domésticas, suprimos expectativas daqueles que estão à nossa volta e assim geramos saúde para nós, para o outro e na comunidade local.

5) JESUS COMO MODELO PARA UMA PASTORAL EM BUSCA DA SAÚDE INTEGRAL

Jesus, nosso mestre e Senhor, é também o grande modelo que a igreja tem para o cumprimento da sua missão integral no mundo. Sendo assim, Jesus é também o modelo para uma poimênica que busca promover a saúde integral no ser humano e na sociedade. O termo “poimênica” vem do grego “poimen” que significa “pastor”. Sendo assim, a poimênica tem a ver com o trabalho pastoral de um modo geral. Jesus relacionou seu ministério à questão da sanidade do indivíduo. Os seus milagres eram milagres de saúde, de sanidade física, psíquica ou mesmo espiritual. Encontramos nos evangelhos inúmeras narrativas que descrevem a ação salvadora de Jesus em direção às pessoas, curando-as de muitas maneiras. Ao ser questionado pelos discípulos de João Batista sobre sua messianidade, Jesus respondeu: “…os cegos vêem, os coxos andam, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos são ressuscitados, e aos pobres anuncia-se-lhes o evangelho” (Lc 7:22). Mais uma vez a sanidade é descrita como evidência da presença do reino de Deus entre as pessoas. Confirma-se assim a premissa de que o plano redentor de Deus está voltado para o resgate da integralidade do ser humano. O próprio Jesus é um modelo de saúde para todos nós, a começar pelo fato dele não ter sofrido a desintegração causada pelo pecado. Podemos, encontrar em sua vida e ministério alguns aspectos para uma poimênica libertadora e geradora de vida para muitos. Um modelo pastoral curador. Vejamos então alguns desses aspectos:
1º - olhar empático sobre as pessoas – no texto que narra a multiplicação dos pães a cena é precedida por um olhar compassivo de Jesus, que via a multidão como ovelhas sem pastor. Houve então uma identificação com aqueles que sofriam por alguma razão. Essa empatia leva ao segundo ponto.

2º - Atitude solícita – Jesus era alguém solícito, pronto, com um coração aberto para novos fatos e novas situações. Sua grande agenda eram as pessoas. Ele podia até abrir mão de um descanso pessoal em função da demanda de uma só pessoa ou de todo um grupo.
3º - atitude de aceitação – Jesus foi reprovado por várias autoridades religiosas exatamente por ter uma postura que aceitava muitos excluídos e enfermos da sociedade. Almoçava com pecadores, tinha discípulos nada convencionais e conversava com as prostitutas. Tal ação era profundamente libertadora.

4º - Atitude de perdão – Jesus era a expressão maior da graça de Deus e, portanto, do perdão divino. Sua reação para com a mulher pega em adultério (João 8) revela um Deus perdoador que dá a segunda chance concedendo libertação da culpa que aprisiona e impede o crescimento.

5º - Quebra de preconceitos – Jesus rompeu barreiras, questionou e quebrou paradigmas sem preocupar-se com as conseqüências para sua vida. Conversar com a mulher samaritana (João 4) além de romper a barreira cultural, curou a enfermidade do preconceito e gerou sanidade para toda uma aldeia.

6º - Através do serviço – provavelmente, o maior sinal de saúde integral de Jesus foi o fato de ter assumido uma posição de servo, que procurava estar entre as pessoas, aproveitando situações para servir e ministrar graça àqueles que dela necessitavam (Marcos 10:35-45). Lavar os pés dos discípulos é evidência clara de que a cura inicia-se com gestos concretos de serviço.

7º - Amar até a própria morte – paradoxalmente, a morte também gera vida, muita vida (Jo: 12:24). Jesus tomou sobre si nossas enfermidades (Is 53), compartilhou das nossas chagas e maldições por amor. Sua morte produziu sanidade na vida de muitos. O Seu amor pelos discípulos foi até o fim (Jo 13:1).

A pessoa e a presença de Jesus eram por si só expressões de sanidade e geradores de saúde para aqueles que com Ele conviviam. Sua capacidade de amar, Sua compaixão, Suas ações com o propósito de gerar integralidade na vida das pessoas, se tornaram pistas importantes para uma poimênica nos nossos dias, cujo objetivo deve ser levar a igreja a desenvolver modelo semelhante ao de Jesus, tornando-se assim uma comunidade de salvação e cura, de libertação para o desenvolvimento das potencialidades de seus membros

6) PASTOR NERVOSO, IGREJA NEURÓTICA - o ministério pastoral e a igreja terapêutica.

Queremos agora conversar sobre o papel do pastor na construção de uma igreja cuja vocação terapêutica encontre expressão concreta no seu dia a dia. Já é um fato conhecido que, como conseqüência das funções desempenhadas, o pastor constitui uma figura com destaque e influência, O pastor influencia e molda opiniões, transmitindo uma visão de mundo aos seus ouvintes. De modo muito natural, o pastor participa diretamente da vida das pessoas, intervindo, aconselhando, emitindo opiniões, etc. Conforme Almir Linhares de Faria , no seu artigo “Implicações psicológicas da tarefa pastoral”, a figura do pastor concentra um certo poder; assim, “a sua pessoa, seu modo de vida, seus sermões e suas diversas atividades pastorais fornecem padrões de referência para o comportamento e atitude de muitas pessoas.” (1985, p.17). Vemos então que o pastor está numa ampla esfera de influência na vida da comunidade. Esta, por sua vez, refletirá o estilo de vida e ministério do seu pastor. Sendo assim, cabe ao pastor a responsabilidade de trabalhar a vida da igreja a fim de levá-la a desenvolver relacionamentos saudáveis, curadores, e gerar ambiente de solidariedade na igreja local.

Segundo Clinebell, “a poimênica e o aconselhamento pastoral são eficazes na medida em que ajudam as pessoas a aumentar sua capacidade de relacionar-se de maneiras que fomentem a integralidade nelas mesmas e nas outras pessoas.” (CLINEBELL, 1987, P.30). Na verdade, para o autor, o próprio objetivo da poimênica é a integralidade do ser humano. Isso significa que um ministério pastoral que não desemboque em cura, relacionamentos mais profundos e verdadeiros, ambiente de aceitação, etc, está absolutamente desfocado quanto à sua missão. Um pouco antes, Clinebell declarara: “Poimênica é o ministério amplo e inclusivo de cura e crescimento mútuos dentro de uma congregação e de sua comunidade, durante todo o ciclo da vida.” (op.cit., P.25). Nesse sentido, alguns estudiosos têm proposto algumas funções no ministério pastoral, porque geram integralidade. Senão vejamos: 1) O pastor como aquele que cura/cuida – trata-se do processo de sarar as feridas, gerando saúde física, emocional e espiritual, levando o indivíduo ao crescimento e restituindo-o à sua integralidade. 2) O pastor como aquele que sustenta – é o ato de ajudar alguém a suportar uma situação aparentemente impossível de ser transformada. Ex: uma doença incurável. Trata-se aqui do consolo e encorajamento para experimentar graça em meio ao caos.

3) O pastor como aquele que orienta – é o processo de dar conselho, dirigir e funcionar como uma autoridade. Ajudar as pessoas a aprenderem por si mesmas, ajudando-as também a fazer escolhas convictas e confiantes em situações que terão desdobramentos importantes no futuro.

4) O pastor como aquele que reconcilia – procura levar o ser humano a reconciliar-se com Deus, com o outro e consigo mesmo, seja através do perdão, da disciplina ou de uma consciência viva de pertencer ao povo de Deus.

5) O pastor como aquele que nutre – seu objetivo, segundo Clinebell, “é capacitar as pessoas a desenvolver as potencialidades que lhes foram dadas por Deus.” (op.cit., p.40). Ao mesmo tempo significa nutrir com amor as pessoas, a cada dia, na totalidade de suas vidas. À medida que entendemos que a igreja é uma comunidade terapêutica, uma comunidade da poimênica, que “presta assistência, promove cura e possibilita crescimento” (op.cit., p.33), então é certo dizer que também cabe ao pastor a tarefa de treinar a igreja nesta vocação, a fim de que seus membros desenvolvam na prática a verdade do ‘sacerdócio universal de todos os santos’, sendo ministros uns dos outros. “O papel do pastor consiste em treinar, inspirar e supervisionar as pessoas leigas no ministério de poimênicas destas.” (op.cit., p.33). Podemos perceber então a importância do trabalho pastoral na transformação de uma igreja local em comunidade terapêutica . Pastores saudáveis e equilibrados, ou pelo menos conscientes de suas limitações e em busca de sua integralidade, saberão orientar os membros rumo ao crescimento. Por outro lado, pastores sem esta consciência, desfocados de sua integralidade, dificultarão e prejudicarão o desenvolvimento dos membros de sua comunidade. Poderíamos dizer então que, neste caso, pastores nervosos gerarão igrejas neuróticas. Quão grande é a responsabilidade do pastor quanto ao bem estar e crescimento da igreja rumo ao cumprimento de sua missão integral!

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Refletir sobre a vocação terapêutica da igreja é também refletir sobre as mais variadas prioridades que, como igreja, vamos elegendo ao longo da nossa caminhada. Perguntas como: “O que é importante para nós?” e “Que tipo de igreja estamos construindo?” vão surgindo enquanto refletimos e requerem uma resposta. Procuramos mostrar neste trabalho a necessidade premente pela busca de uma igreja relacional, cujo ambiente de amor e aceitação possa gerar esperanças e encorajamento no coração daqueles que da igreja se aproximam. Para que isso aconteça a igreja precisa ser uma comunidade mais de relacionamentos e menos de realizações. Como alcançar este propósito? São muitas as maneiras, mas talvez possamos oferecer algumas pistas:
1ª) Ser uma igreja relacional deve fazer parte da declaração de missão da igreja;

2ª) Esta convicção deve fazer parte da convicção ministerial do pastor, bem como de toda a liderança;

3ª) Desenvolver programas que facilitem o encontro e o relacionamento entre seus membros, de modo que os mandamentos recíprocos encontrem ambiente para serem praticados. P. ex., grupos pequenos, ministério de discipulado, encontros acampamentos, etc.

4ª) Promover ambiente alegre e informal nas reuniões, nos cultos, sem contudo perder a reverência e o respeito que os momentos exigem;

5ª) Ministrações à igreja sobre relacionamentos através do púlpito, boletins, aconselhamento pessoal, estudos bíblicos, etc.

6ª) Começar pela liderança maior da igreja. A relação pastor-líderes deve ser uma relação de amor, aliança e cumplicidade, não permitindo que as tensões normais do dia a dia da igreja ganhem contornos de problema de relacionamento entre a liderança.

É sempre bom lembrar que uma igreja jamais irá além de onde está sua liderança, portanto, tudo começa e termina com os líderes!

7ª) Treinar os membros para que desenvolvam seus dons espirituais a fim de ministrarem uns aos outros e desenvolverem eles próprios seu ministério de poimênica;

8ª) Avaliação constante da saúde da igreja. Certamente existem bons materiais para isso, no entanto gostaria de indicar o capítulo 12 do livro “Creating a healthier church – family systems theory, leadership and congregational life”, de R. W. Richardson (1996, pp.159-183), onde o autor oferece parâmetros para tal avaliação.

Entendemos que há ainda muito a se discutir sobre este tema, no entanto, coube-nos a tarefa de despertar a atenção dos líderes para este aspecto tão importante para a vida da igreja.

Lembro-me de ter ouvido certa vez, em meio a um congresso sobre a batalha espiritual na qual estamos inseridos, uma frase que acentuou ainda mais esta nossa convicção quanto à vocação terapêutica da igreja: “A igreja, antes de ser um quartel general é a comunidade do amor!”

Este é o nosso desejo e assim esperamos que seja.

Amém!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALLEN, E. A., Saúde integral a partir da igreja local. Curitiba, Ed. Descoberta, 1998
ARNOLD, W. V., Introduction to pastoral care. Philadelphia, The Westminster Press, 1982
CLINEBELL, H. J., Aconselhamento pastoral – um modelo centrado em libertação e crescimento. São Paulo, Ed. Paulinas e Ed. Sinodal, 1987
COLLINS, G. R., Ajudando uns aos outros pelo aconselhamento. São Paulo, Ed. Vida Nova, 2ed, 1990
CRABB, L., Princípios básicos de aconselhamento bíblico. Brasília, Ed. Refúgio, 2ed, 1998
FARIA, A. L., Implicações psicológicas da tarefa pastoral, In: Saúde pastoral e comunitária, LISBOA, A. H.(org), São Paulo, CPPC, 2ed., 1985,pp.16-18
HECKERT, U., A busca da integridade, In: Saúde pastoral e comunitária, LISBOA, A. H.(org), São Paulo, CPPC, 2ed., 1985, pp.12-16
LEÓN, J. A., Introdução à psicologia pastoral. São Leopoldo, Ed. Sinodal, 1996
RICHARDSON, R. W., Creating a Healthier Church – family systems theory, leadership and congregational life. Minneapolis, Fortress Press, 1996
VV. AA., Psicologia e ajuda pastoral, São Paulo, CPPC e Nascente – Livraria e Editora Ltda, 1985
VANIER, J., Comunidade, lugar do perdão e da festa. São Paulo, Paulinas, 3ed., 1985
ZANDRINO, R., Curar também é tarefa da igreja, São Paulo, CPPC, 1986

FÉ, RAZÃO E O CRISTÃO EDUCADO

Junho 12th, 2007

Fé, razão e o cristão educado

Humberto M. Rasi

“Senhor, ajuda-me a nunca usar minha razão contra a Verdade”. — Oração Judaica

Qual é a relação apropriada entre fé e razão na vida de um crente? Através dos séculos, este assunto tem sido objeto de extremo interesse e preocupação entre os pensadores cristãos. Crentes envolvidos em estágios mais avançados de estudo, pesquisa ou profissões que desafiam a base da fé da pessoa, deparam-se continuamente com o dilema de como integrar fé e razão em sua vida diária. Essa tensão é intensificada pelo fato de muitas pessoas atualmente suporem que indivíduos inteligentes não são religiosos ou, se são, preferem guardar tais crenças em segredo.

Como esse assunto foi tratado pelos intelectuais cristãos no passado? Este artigo proverá um breve estudo histórico das opções, analisará importantes textos bíblicos sobre o tema, propondo maneiras pelas quais cristãos pensantes possam satisfazer seu entusiasmo por ambos, a crença e o cultivo de uma fé racional.

Premissas e definições

De acordo com as Escrituras, Deus criou Adão e Eva no princípio da história humana e os dotou com a capacidade de raciocinar, “a faculdade de pensar e agir”.1 Exercitando estas habilidades, nossos primeiros pais desobedeceram a Deus e, como resultado, perderam sua condição perfeita e seu lar. A despeito de termos herdado a fraqueza da natureza caída de Adão e Eva, Deus tem preservado nossa capacidade de pensar por nós mesmos, exercitar confiança e tomar decisões. De fato, um dos objetivos da educação adventista é “treinar os jovens para que sejam pensantes, e não meros refletores do pensamento de outrem”. 2

Antes de prosseguirmos, a clareza requer que definamos alguns termos:

Fé, de uma perspectiva cristã, é um ato da vontade que escolhe depositar sua confiança em Deus em resposta a Sua auto-revelação e às manifestações do Espírito Santo em nossa consciência.3 Fé religiosa é mais forte do que crença; ela inclui o desejo de viver e até de morrer pelas convicções pessoais.

Razão é o exercício da capacidade mental para o pensamento racional, compreensão, discernimento e aceitação de um conceito ou idéia. Razão clama por coerência, clareza, consistência e evidência adequada.

Crença é o ato mental de aceitar uma afirmação ou uma pessoa como uma verdade, fato ou algo real. No entanto, é possível também sustentar uma crença em algo que não seja verdadeiro.

Vontade é a habilidade e poder de eleger uma crença específica ou um curso de ação de preferência a outros. Escolha é o livre exercício de tal habilidade.

Razão e fé estão relacionadas assime-tricamente. É possível crer que Deus existe (razão) sem crer em Deus ou confiar nEle (fé). 4 Mas é impossível crer e confiar em Deus (fé) sem acreditar que Ele existe (razão).

Eu aceito a primazia da fé na vida cristã intelectual, como expressa em duas formulações clássicas: Fides quaerens intellectum (”Fé buscando entendimento) e Credo ut intelligam (”Eu creio a fim de poder entender”). Razão é importante para a fé, mas não pode substituí-la. Para um cristão adquirir conhecimento per se não é o supremo objetivo da vida. O propósito mais elevado da vida é conhecer a Deus e estabelecer um relacionamento pessoal e amoroso com Ele. Tal confiança e amizade promovem a obediência a Deus e um serviço abnegado em favor dos nossos semelhantes.

Relacionamento entre fé e razão

Como os crentes do passado relacionaram as questões da fé e da razão? Como deveríamos nós relacioná-las? Ao longo da era cristã, as pessoas têm adotado diversas abordagens que podem ser assim descritas: 5

1. Fideísmo: A fé ignora ou minimiza o papel da razão para chegar à verdade suprema. De acordo com esta posição, fé em Deus é o critério supremo da verdade ou seja, é tudo o que um cristão precisa para obter a certeza e salvação. Os fideístas declaram que Deus Se revela à consciência humana por meio das Escrituras, do Espírito Santo e da experiência pessoal, o que é suficiente para se conhecer todas as verdades importantes. Um ditado popular contemporâneo sintetiza este pensamento: “Deus disse. Eu creio. Isto é suficiente”.

O fideísmo radical, não racional, foi primeiramente articulado por Tertuliano (160? - 230?), um primitivo cristão apologista conhecido por sua atitude crítica para com a cultura da época. Foi o argumentador Tertuliano que disse: Credo quia absurdum (”Eu creio porque é um absurdo”). Nos séculos seguintes outros autores cristãos exaltaram o valor supremo da fé cega em oposição direta à razão humana. Levado a um extremo, o fideísmo rejeita o pensamento racional, opõe-se à educação avançada e à pesquisa científica e pode conduzir a uma religião mística e individualizada.

Os críticos do fideísmo, especialmente de sua expressão mais radical, observam que a fé em Deus e em Jesus Cristo pressupõe a existência de um Deus que Se revelou à humanidade na pessoa de Jesus. E a menos que estas pressuposições sejam comprovadas razoáveis, ou pelo menos não contrárias à razão, não é mais apropriado crer nelas do que crer em absurdos. Além disso, cristãos que aceitam a Bíblia como uma revelação confiável de Deus, devem necessariamente, exercitar suas habilidades racionais para compreender e aceitar as proposições e exortações contidas nas Escrituras. Se a Bíblia é verdadeiramente uma expressão proposicional da vontade de Deus, bem como a base para a fé e a prática do cristianismo, a razão humana não pode ser desprezada.

2. Racionalismo: O raciocínio humano desafia e pode finalmente minar a fé religiosa. Os racionalistas sustentam que o raciocínio humano constitui a fonte principal de conhecimento e verdade, provendo assim a base para a crença.

O racionalismo moderno rejeita a autoridade religiosa e a revelação espiritual de informação confiável. Iniciando com o reavivamento humanístico da Renascença na Europa (séculos XIV a XVI), que exaltava o potencial e a criatividade humana, o racionalismo floresceu durante o Iluminismo (século XVIII), com sua crítica sistemática às instituições e doutrinas defendidas na época. Esse movimento se transformou no ceticismo moderno, o qual levanta questionamentos, dúvidas e discor-dâncias das conclusões e crenças geralmente aceitas e finalmente no ateísmo que nega a existência de Deus. Friedrich Nietzsche, Karl Marx e Sigmund Freud são representantes dessa posição.

Em oposição à fé, o racionalismo argumenta que as religiões tendem a sustentar crenças tradicionais, por vezes irracionais e frustrar a auto-realização dos seres humanos, tanto individual como coletivamente. Os racionalistas também argumentam que a realidade do mal no mundo é incompatível com a existência de um Deus poderoso, amoroso e sábio como tradicionalmente aceito pelos cristãos.

3. Dualismo: Fé e razão atuam em esferas separadas; nenhuma confirmando ou contradizendo a outra. Muitos cientistas contemporâneos, alguns deles cristãos, sustentam que a ciência lida com “fatos” objetivos, ao passo que a religião trata dos assuntos morais sob uma perspectiva pessoal e subjetiva. Portanto, as esferas de atividade da razão e da fé, do conhecimento e dos valores, não estão relacionadas entre si. 6

Os cristãos que crêem na Bíblia não estão dispostos a aceitar essa posição. Eles argumentam, por exemplo, que Jesus Cristo, conforme revelado nos Evangelhos, não é apenas o centro de sua fé como o Deus encarnado, mas é também uma Pessoa real que viveu na Terra em tempo e lugar específicos na história humana. Eles afirmam que os eventos narrados e os personagens apresentados nas Escrituras também foram reais e fizeram parte de um histórico contínuo, conforme provas advindas de um volume crescente de evidências documentais e arqueológicas.

Qualquer tentativa de separar as esferas da razão e da fé, rebaixam a religião cristã a uma esfera de sentimentos pessoais, subjetividade individual e por fim ao nível de irrelevância mítica e imaginária. Tanto cristãos como não-cristãos sustentam diversas crenças por vezes contraditórias. Se elas não podem ser distinguidas quanto a sua veracidade ou falsidade pelo uso de evidências e argumentos razoáveis, então nenhuma crença, quer religiosa ou filosófica, pode reivindicar confiabilidade e lealdade.

4. Sinergia: Fé e razão podem colaborar e fortalecer uma à outra na busca humana por um compromisso com a verdade. Defensores desta posição sustentam a idéia de que o cristianismo constitui um sistema integrado e internamente coerente de crença e prática que merece tanto o compromisso com a fé quanto o consentimento racional. Os domínios da fé e da razão se sobrepõem. As verdades baseadas apenas na fé são as reveladas por Deus, mas que não podem ser percebidas pelo pensamento racional (por exemplo, a Trindade, salvação pela fé na graça de Deus). Verdades às quais podemos chegar tanto através da fé como da razão, são reveladas por Deus, mas também passíveis de serem percebidas e compreendidas pela razão humana (por exemplo, a existência de Deus, o objetivo da lei moral). As verdades sustentadas pela razão e não pela fé são aquelas não reveladas diretamente por Deus, mas descobertas pela razão humana (por exemplo, as leis físicas, as fórmulas matemáticas).

C. S. Lewis, renomado apologista cristão, argumentava que a fim de serem verdadeiramente morais, os seres humanos devem crer que os princípios morais básicos não são dependentes das convenções humanas. Esses conceitos possuem uma realidade transcendente que os torna conhecidos por todos. Lewis defendeu ainda que a existência de tais princípios pressupõe a existência de um Ser habilitado e disposto a promulgá-los.

Se o mundo real pode ser compreendido pela razão humana sob a premissa da investigação e experiência, então ele é um mundo inteligível. A acessibilidade deste mundo à investigação científica tanto no nível celular quanto galáctico permite aos seres humanos descobrir leis que fornecem evidências para um plano inteligente da mais complexa espécie. Esse plano extremamente elaborado de todas as facetas do Universo, que torna possível a vida inteligente neste planeta, aponta para um Arquiteto.

Portanto, a experiência religiosa e a consciência moral podem ser vistas como sinais da existência do mesmo Ser, que a pesquisa científica antevê como o Arquiteto inteligente do cosmos e o Mantenedor da vida.7

A razão pode nos ajudar a mover da compreensão para a aceitação e, conseqüentemente à crença. Entretanto, a fé é a escolha da vontade que ultrapassa a razão. Uma cuidadosa reflexão, guiada pelo Espírito Santo, pode remover obstáculos na vereda da fé. Uma vez que a fé esteja presente, a razão pode fortalecer o compromisso religioso. 8

Fé e razão na perspectiva bíblica

A cosmovisão hebraica, conforme apresentada no Antigo Testamento, concebia a vida humana como uma unidade integrada que incluía crença e comportamento, confiança e raciocínio. Durante a maior parte de sua existência, o povo de Israel aceitou como verdade, a realidade de Deus, onde Suas revelações foram documentadas nas Escrituras e onde Suas intervenções sobrenaturais foram evidentes em sua história. Para eles, o inimigo da crença no verdadeiro Deus não era o ceticismo, mas a adoração a outros deuses, os quais eram meros produtos da imaginação humana. O propósito do povo não era um conhecimento teórico, mas sabedoria — o dom do raciocínio correto que leva a pessoa a uma escolha sábia e a um viver justo. “O temor do Senhor é o princípio da sabedoria, e o conhecimento do Santo é prudência” (Provérbios 9:10).

O Novo Testamento reflete a mudança em direção ao contexto cultural, no qual o monoteísmo hebraico tinha já se fragmentado em várias seitas judaicas, e tinha também recebido influência do politeísmo greco-romano, culto ao imperador e agnosticismo. Enquanto a Igreja Cristã Primitiva interagia com este ambiente religioso-filosófico, ela passou a articular a distinção entre fé e razão, outorgando à fé a posição de privilégio na vida do crente.

Especificamente no Novo Testamento, o ensino bíblico que diz respeito à fé e razão, pode ser resumido nas seguintes proposições:

1. O Espírito Santo desperta a fé e ilumina a razão. Se não fosse a persistente influência do Espírito Santo na consciência humana, ninguém jamais se tornaria um cristão. Em nossa condição natural, não possuímos a disposição de buscar a Deus (Romanos 3:10, 11), de reconhecer nossa necessidade emergente de Sua graça (João 16:7-11), ou de compreender as coisas espirituais (I Coríntios 2:14). Somente pela influência do Espírito Santo, somos levados a aceitar, crer e confiar em Deus (João 16:14). Após esta miraculosa transformação (Romanos 12:1, 2), o Espírito Santo nos ensina (João 14:26), guia à compreensão “de toda a verdade” (João 16:3), habilitando-nos a discernir entre a verdade e o erro (I João 4:1-3).

2. A Fé deve ser desenvolvida e praticada durante toda a vida. Cada ser humano recebe uma “medida de fé” (Romanos 12:3) — isto é, a capacidade básica de confiar em Deus — e cada ser humano é encorajado a crescer “mais e mais” em fé (II Tessalonicenses 1:3). De fato, “sem fé é impossível agradar a Deus, porquanto é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que Ele existe e que se torna galardoador dos que O buscam” (Hebreus 11:6). Por isso, a súplica de um pai angustiado a Jesus: “Eu creio! Ajuda-me na minha falta de fé! (Marcos 9:24), e o pedido insistente dos discípulos, “Aumenta nossa fé” (Lucas 17:5).

3. Deus valoriza e apela à razão humana. Embora os pensamentos de Deus sejam infinitamente superiores aos nossos (Isaías 55:8, 9), Ele escolheu comunicar-se inteligentemente com a raça humana, revelando a Si mesmo através das Escrituras (II Pedro 1:20, 21), através de Jesus Cristo que chamou a Si mesmo de “a Verdade” (João 14:6) e através da natureza (Salmo 19:1). Deus quer “arrazoar” conosco (Isaías 1:18). Jesus freqüentemente envolvia Seus ouvintes em diálogo e reflexão, incentivando-os a uma resposta consciente (ver por exemplo, Sua conversa com Nicodemos, João 3; e a mulher sama-ritana, João 4). Diante do pedido feito pelo oficial etíope, Felipe explicou uma profecia messiânica encontrada nas Escrituras, a fim de que ele pudesse compreender e crer (Atos 8:30 - 35). Os crentes de Beréia foram elogiados por examinarem “as Escrituras todos os dias para ver se as coisas eram, de fato assim” (Atos 17:11). O propósito supremo da vida é conhecer a Deus e aceitar a Cristo como Salvador, tal conhecimento pessoal nos conduz à vida eterna (João 17:3).

4. Deus nos provê suficiente evidência para crer e confiar nEle. O observador imparcial pode reconhecer no universo natural o poder criador e mantenedor (Isaías 40:26). Suas “qualidades invisíveis — Seu poder e natureza eternos — têm sido claramente visíveis” e compreendidos por intermédio das “coisas que Ele fez”. Aqueles que, a despeito das evidências, negam Sua existência e poder criador “são indesculpá-veis” (Romanos 1:20). Entretanto, quando Tomé expressou dúvidas sobre a realidade da ressurreição, Cristo lhe deu uma evidência física e o desafiou: “Não sejas incrédulo, mas crente” (João 20:27-29). Quando somos confrontados com questões referentes à origem do Universo, nosso ponto de partida deve ser a fé baseada na revelação de Deus: “Pela fé, entendemos que foi o Universo formado pela palavra de Deus, de maneira que o visível veio a existir das coisas que não aparecem” (Hebreus 11:3). 9

5. Deus provê claras orientações para a vida, mas aceita as escolhas que fazemos. No Jardim do Éden, Deus deu a Adão e Eva o livre arbítrio — para obedecê-Lo ou não — e os advertiu quanto às tristes conseqüências de sua desobediência (Gênesis 2:16, 17). Falando por intermédio de Moisés, Deus reiterou as opções: “Vê que proponho, hoje, a vida e o bem, a morte e o mal… escolhe, pois, a vida, para que vivas, tu e tua descendência” (Deuteronômio 30:15, 19). Seus apelos à consciência humana são perfeitamente afáveis: “Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele comigo” (Apocalipse 3:20). Acima de tudo Deus busca encontrar em Seus filhos amor, obediência e adoração, que são resultado da razão e do livre arbítrio (João 4:23, 24; 14:15, Romanos 12:1 [logikén = razoável e espiritual]).

6. Fé e razão trabalham juntas na vida e no testemunho do cristão. Paulo atesta que a aceitação de Jesus como Salvador depende de um entendimento racional do Evangelho. “A fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo” (Romanos 10:17). Os cristãos devem estar “sempre preparados para responder a todo aquele que vos pedir razão da esperança que há em vós” (I Pedro 3:15 [resposta = apologían em grego, defesa, justificação; razão = lógon em grego, uma palavra, uma explicação]). Pedro também encoraja os cristãos: “Com toda diligência, associai com a fé a virtude; com a virtude, o conhecimento” (II Pedro 1:5, 6).

Lidando com perguntas e dúvidas

Vamos agora considerar as implicações práticas daquilo que examinamos. Como devem os cristãos que crêem na Bíblia lidar com a tensão que surge inevitavelmente entre a fé e a razão, quando eles se deparam com temas conflitantes em seu estudo, pesquisa ou experiência de vida? As seguintes sugestões podem ser úteis: 10

1. Lembrar-se de que Deus e a verdade são inseparáveis. Deus nos criou como seres racionais e inquiridores. Ele é honrado quando usamos nossas habilidades mentais para explorar, descobrir, aprender e inventar, ao interagirmos com o mundo que criou e sustém. Sempre que usarmos nossa racionalidade e criatividade em atitude de humildade e gratidão, estaremos expressando amor a Deus com a nossa mente. Os cristãos não devem temer estudar, pesquisar e descobrir. Se há discrepâncias entre “a verdade de Deus” e a “verdade humana”, é porque não compreendemos uma ou a outra, ou ambas. Sendo que em Cristo “todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento estão ocultos” (Colossenses 2:3), toda verdade pertence a Deus.

2. Aceitar o fato de que a Bíblia não revela todas as coisas que existem para conhecermos. O conhecimento de Deus é infinitamente maior e mais profundo que o nosso. Por essa razão, Ele precisou descer ao nosso nível para estabelecer comunicação conosco, respeitando nossa capacidade de compreensão. Como Jesus disse aos discípulos: “Tenho ainda muito que vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora” (João 16:12). Além disso, nossa natureza caída prejudica e limita nossa compreensão. “Porque, agora, vemos como em espelho, obscuramente; então, veremos face a face. Agora, conheço em parte; então, conhecerei como também sou conhecido” (I Coríntios 13:12). A Bíblia pode ser encarada como um livro de história, literatura, leis ou biografias. Mas, seu principal objetivo é ajudar-nos a conhecer a Deus e ensinar-nos como nos tornarmos Seus amigos e vivermos piamente tendo em vista a eternidade. Na Nova Terra teremos tempo e oportunidade de explorar e aprender da vasta complexidade do cosmos e seus habitantes.

3. Fazer distinção entre a Palavra de Deus e as interpretações humanas. Tradições humanas e idéias preconcebidas freqüentemente nos levam a ler certas coisas na Bíblia que não estão escritas ali. Um exemplo clássico é o caso de Copérnico (1473-1543), que, com base em seus estudos e observações, propôs que os planetas, incluindo a Terra, giravam ao redor do Sol. Sendo que a maioria dos astrônomos de sua época ainda acreditava na teoria geocêntrica de Ptolomeu, muitos líderes religiosos daqueles dias consideraram heréticas as idéias de Copérnico. Em função da importância dos seres humanos e da centralidade da Terra nos planos de Deus, eles acreditavam que o Sol e os planetas giravam em torno da Terra. Quando Galileu e Kepler forneceram evidências em favor da teoria de Copérnico, a descoberta não destruiu Deus nem o cristianismo.

Três séculos depois, Charles Darwin discordou de muitos teólogos de seu tempo, que acreditavam na fixidez absoluta das espécies, a qual não é sustentada pela narrativa bíblica. Há não muitos anos, alguns cristãos afirmavam que Deus não permitiria que seres humanos viajassem pelo espaço ou chegassem à Lua. Novamente, tais afirmações estavam completamente equivocadas, revelando que se baseavam em interpretações e extrapolações pessoais.

4. Compreender que a iniciativa científica é uma exploração contínua de um segmento da realidade. A ciência experimental lida somente com fenômenos que podem ser observados, medidos, manipulados, repetidos e falsificados. Em oposição à impressão que alguém possa obter de muitos livros científicos e da mídia popular, a ciência moderna experimental freqüentemente nos leva a alguns ajustes. Na verdade, muitas das leis básicas são universalmente aceitas. Mas, ao continuarem suas pesquisas, os cientistas se valem do fato de que as teorias e explicações que foram aceitas por anos podem ser substituídas por outras teorias e interpretações que parecem mais precisas e confiáveis.11 Como objeto do método, os cientistas trabalham em suas disciplinas dentro de uma estrutura naturalista, a qual exclui o sobrenatural. Muitos deles são agnósticos ou ateus; entretanto, suas crenças não estão baseadas em evidências científicas, mas em opção pessoal. Os cientistas que estão abertos à possibilidade da existência de Deus, encontram no mundo natural inúmeras evidências de que existe um Arquiteto Inteligente que planejou e sustenta o Universo e a vida.

5. Criar um arquivo mental para problemas não resolvidos. Algumas perguntas aparecerão inevitavelmente em nossos estudos, em nossa experiência de vida e mesmo na Bíblia para as quais não temos respostas satisfatórias. Em alguns casos encontramos uma explicação posterior. Em outros casos, as perguntas permanecem não respondidas. Um exemplo clássico é a tensão entre a nossa crença em um Deus amoroso e Todo-Poderoso, e o sofrimento de inocentes. A despeito de evidências abundantes do poder e cuidado de Deus, não podemos compreender plenamente porque tragédias humanas e desastres naturais ocorrem em um Universo onde Ele é soberano. Como outros crentes do passado, tentamos encontrar sentido neste e em outros mistérios. O melhor que podemos fazer com estes assuntos é evitar o julgamento, prosseguir estudando com oração e buscar conselho com cristãos mais experientes. Algum dia alcançaremos um novo discernimento quanto aos mistérios, ou Deus nos esclarecerá tais contradições. A fé em Deus e o reconhecimento de nossas limitações mentais exigem que aprendamos a viver com algumas incertezas e mistérios.

Conclusão

Como forma de ilustrar o objetivo principal deste artigo, podemos imaginar nossa mente como um tribunal que funciona todos os dias, com sua integridade e liberdade protegidas pelo próprio Deus.12 No tribunal, nossa individualidade se assentará como juiz, enquanto a razão e a fé serão os advogados que trarão evidências a serem consideradas, e testemunhas para apresentarem seu parecer. A evidência e o testemunho provido por eles são advindos de uma variedade de fontes, as quais incluem: a influência e pessoas que amamos e respeitamos, o sentimento de amar e ser amado, nossa interação social e diálogo com outros, observações do mundo natural, experiências religiosas através da oração e do serviço a outros, leitura e pesquisa, alegrias e tristezas da vida, adoração individual e coletiva, reação à beleza das artes, efeito dos nossos hábitos e estilo de vida e a busca pela coerência e autenticidade interior.

Nossa vontade irá filtrar diariamente esta multiplicidade de informações e percepções emocionais, espirituais, racionais e estéticas, comparando-as com o código — nossa cosmovisão.13

Por vezes, os argumentos mais complexos serão aceitos e fortalecerão as convicções. Em outras ocasiões, a evidência apresentada produzirá um ajuste em nossa cosmovisão e uma mudança em nossas crenças. Por outro lado, essas mudanças influenciarão nossa conduta. Outras vezes, a vontade preferirá não decidir. Sentado amavelmente no fundo da cena, o Espírito Santo está preparado para proferir uma palavra de advertência, correção ou afirmação. Outras vozes, talvez de observadores não convidados, são também ouvidas no tribunal, levantando objeções, apresentando evidências contrárias e dúvidas insinuantes. O tribunal de nossa vontade continuará a deliberar até o último dia da nossa vida consciente.

Como cristãos pensantes, somos desafiados a amar a Deus com nossa mente e nossa vontade, integrando na vida as exigências da fé e do intelecto. Para o cristão educado, “não há incompatibilidade entre a fé vital e a aprendizagem ampla, profunda e disciplinada, entre a piedade e o pensamento diligente, entre a vida da fé e a vida da mente”. 14 Para nutrir estas três facetas das habilidades concedidas por Deus — fé, intelecto e vontade — devemos aprofundar diariamente nossa amizade com Deus e nosso compromisso com a verdade. Ele confia que, diante das evidências disponíveis, nos tornaremos sábios em nossas decisões. 15

Humberto M. Rasi (Ph.D. pela Universidade de Stanford), aposentado recentemente da direção do Departamento de Educação da Associação Geral da IASD, continua atuando como editor-chefe da revista Diálogo.

Notas e referências

A menos que esteja indicado, todas as passagens da Bíblia neste artigo são citadas da versão Almeida Revista e Atualizada no Brasil (ARA).

1. Ellen G. White, Educação. Casa Publicadora Brasileira, Santo André, SP 1977, p. 17.

2. Ibidem.

3. No mesmo livro, Ellen G. White define claramente a fé: “A fé é a confiança em Deus, ou seja, a crença de que Ele nos ama e conhece perfeitamente o que é para o nosso bem” (p. 253).

4. “Crês, tu, que Deus é um só? Fazes bem. Até os demônios crêem e tremem” (Tiago 2:19).

5. Ver Hugo A. Meynell, “Faith and Reason” em The Encyclopedia of Modern Christian Thought, editado por Alister E. McGrath (Oxford: Blackwell, 1993), pp. 214-219.

6. Stephen Jay Gould, recentemente falecido autor e professor de história da ciência da Universidade Harvard, declarou: “O conflito entre ciência e religião existe somente na mente das pessoas, não na lógica ou utilidade própria destes dois temas completamente diferentes e igualmente vitais”. Em sua opinião, “a ciência tenta documentar o caráter factual do mundo natural, e desenvolver teorias que coordenam e explicam esses fatos. Por outro lado, a religião atua no campo igualmente importante, mas completamente diferente dos propósitos, significados e valores humanos”. (Citado em Houston Smith, Why Religion Matters [Harper San Francisco, 2001], pp. 70, 71).

7. O apóstolo Paulo argumenta: “Quando, pois, os gentios, que não têm lei, procedem, por natureza, de conformidade com a lei, não tendo lei, servem eles de lei para si mesmos. Estes mostraram a norma da lei gravada no seu coração, testemunhando-lhes também a consciência e os seus pensamentos, mutuamente acusando-se ou defendendo-se” (Romanos 2:14, 15).

8. Ver Peter Kreeft e Ronald K. Tacelli, Handbook of Christian Apologetics (Downer’s Grove, Illinois: InterVarsity Press, 1994), pp. 29-44.

9. “O Senhor nunca exige que creiamos em alguma coisa sem nos dar suficientes provas sobre que fundamentemos nossa fé. Sua existência, Seu caráter, a veracidade de Sua Palavra, baseiam-se todos em testemunhos que falam à nossa razão; e esses testemunhos são abundantes. Todavia Deus não afasta a possibilidade da dúvida. Nossa fé deve repousar sobre evidências, e não em demonstrações. Os que quiserem duvidar, hão de encontrar oportunidade; ao passo que os que desejam realmente conhecer a verdade, encontrarão abundantes provas em que basear sua fé”. Ellen G. White, Caminho a Cristo. Casa Publicadora Brasileira, Tatuí, SP, 1994, p. 105.

10. Adaptado de Jay Kesler, “A Survival Kit”, College and University Dialogue 6:2 (1994), pp. 24, 25.

11. Thomas Kuhn, em seu livro The Structure of Scientific Revolutions, 2ª edição (University of Chicago Press, 1970) mostrou como os cientistas trabalham dentro de um paradigma conceitual mutuamente aceito que muda com o tempo.

12. Agradecimentos a Michael Pearson pela estrutura básica desta ilustração que aqui elaborei. Ver seu artigo “Fé, Razão e Vulnerabilidade”, College and University Dialogue 1:1 (1989), pp. 11-13, 27.

13. Uma cosmovisão é uma perspectiva global que cada indivíduo maduro possui a respeito da vida e do mundo. Uma cosmovisão responde a quatro perguntas básicas: Quem sou? Onde estou? O que está errado? Qual é a solução? Ver Brian Walsh e Richard Middleton, The Transforming Vision: Shaping a Christian Worldview (Downers Grove, Illinois: InterVarsity Press, 1984).

14. Arthur F. Holmes, Building the Christian Academy (Grand Rapids, Michigan: William B. Eerdmans Publ. Co., 2001), p. 5. Ver também William Lane Craig, Reasonable Faith: Christian Truth and Apologetics, ed. rev. (Wheaton, Illinois: Crossway Books, 1994).

15. Ver Richard Rice, “When Believers Think”, College and University Dialogue 4:3 (1992), pp. 8-11. Rice é autor do livro Reason and the Contours of Faith (Riverside, Calif.: La Sierra University Press, 1991).

TEOLOGIA DA MISSÃO URBANA NA PERSPECTIVA DO LIVRO DE NAUM

Junho 12th, 2007

TEOLOGIA DA MISSÃO URBANA NA PERSPECTIVA DO LIVRO DE NAUM

SERGIO RIBEIRO

INTRODUÇÃO: CONTEXTO HISTÓRICO: Esse nome significa “compassivo” no hebraico. Naum profetizou em Judá, após a deportação das dez tribos do norte, já nos fins do reinado de Ezequias (Naum 1:11-13;2:1-14). O objetivo da sua mensagem era a cidade de Nínive, capital do império Assírio. Ele era nativo de Elcos, uma aldeia da Galiléia. Depois da queda do norte profetizou para Judá numa época de muita necessidade de consolação com referências aos inimigos Assírios.A mensagem do profeta Naum enfatiza uma grande verdade: Deus não se deixa zombar. Ele, por algum tempo suportará a rebeldia e a soberba do homem, mas não tolerará tal coisa indefinidamente. Nínive teve a sua oportunidade de arrependimento através da mensagem de Jonas, mas agora a misericórdia do Senhor para eles já se tinha passado por voltarem à prática dos pecados de então.
ASSÍRIA: Esse é o nome do império que dominou todo o mundo bíblico antigo, entre os séculos IX e VII AC. A Assíria, entretanto, teve um começo bem humilde, onde o seu território era apenas uma pequena região em formato triangular entre os rios Tigre e Zabe. Ao norte e a leste fazia limites com Média e com as montanhas da Armênia. Não obstante, a história deste antiquíssimo povo pode ser acompanhada desde o ano 1700 AC. Os séculos XVII a XI AC, no caso da Assíria, são chamados os séculos do reino antigo, caracterizados pelo desenvolvimento de várias cidades-estados fortificadas. Com Tiglater Pilesser I começou o período do império Assírio em 1114-1076, expandindo suas fronteiras, tornando-se um império tão forte quanto o Egito. A Assíria foi absorvendo várias populações com a passagem do séculos expandindo suas fronteiras quase às margens do rio Eufrates. Foi atingir uma posição de domínio mundial quando entrou em aliança com a Babilônia. Os assírios eram semitas de raça, eram vigorosos de corpos e de disposição alegre, a julgar por suas festas. Mas a história mostra que eram homens implacáveis, cruéis e sanguinários.
A CIDADE DE NÍNIVE:Era a principal cidade e a última capital da Assíria. Foi fundada por Nironde depois que ele deixou a Babilônia. Escavações arqueológicas que se aprofundam no solo até 25mt mostra que o sítio vinha sendo continuamente ocupado desde tão cedo quanto a 4500 a.C. Localizada à margem do rio Tigre, diante da moderna cidade de Mosul.Em 704-681 Nínive tornou-se a capital do império assírio por instigação de Senaqueribe . Como capital do império assírio, Nínive tornou-se a mais importante cidade do mundo oriental da época. Senaqueribe adornou Nínive a um estado de magnificência. A arqueologia tem descoberto provas sobre isso, e também há muitos informes históricos que confirma isso. O palácio de Senaqueribe tinha 9.178 m2, com paredes que tinha relevos retratando as suas vitórias, incluindo o cerco de Laquis e a cobrança de impostos sobre Judá. Senaqueribe construiu e ampliou as muralhas na cidade, introduziu um novo sistema de água com canais que vinham desde o rio Gomel, em Baviã. Nïnive dispunha de 15 portões principais, dos quais os arqueólogos têm escavado com sucesso. Cada portão era guardado por um touro gigantesco. Senaqueribe também construiu parques botânicos e um jardim zoológico, além de edificar muitos edifícios. O trecho de 2 Reis 18:15 revela-nos que ele cobrou tributos de Ezequias, rei de Judá.Em 612, uma força combinada de medos e babilônicos, atacou e capturou a cidade de Nínive e assim desapareceu para sempre o cruel império assírio. Esse acontecimento foi eloqüemtemenre referido pelos profetas Naum e Sofonias. O local foi subseqüentemente habitado, mas nunca mais adquiriu qualquer significado especial. Na época do profeta Jonas Nínive contava com um a população de cerca de 120.000 pessoas e cerca de 200.000 nos tempo de Naum.
VISÃO DO PROFETA NAUM SOBRE A CIDADE DE NÍNIVE: Os profetas utilizavam de diversas maneiras, como por exemplo as imagens sexuais, para comentar as condutas sociais, política e econômicas de Israel. Eles não foram os primeiros a feminilizar cidades. Esta tradição em descrever as cidades como femininas procede do amplo mundo mitológico do antigo oriente próximo. Era costume literário utilizar tal recurso para apresentar as cidades, especialmente as capitais. Tanto como as mulheres, as cidades não só são débeis e vulneráveis diante das incursões, mas também, abrigam a população dentro de suas muralhas, a alimenta, a cuida e a defende.Dentro deste modo de pensar, também havia a consciência de que as cidades capitais do império ou das monarquias estavam por alguma razão extraordinária, vinculadas a um Deus e protegidas por ele. Tal divindade passava a ser o senhor da cidade, portanto o povo do oriente herdou tal maneira de pensar sobre cidades e mulheres e a utilizaram para extrair paralelos entre as nações de Deus diante da idolatria de Israel e as reações do marido diante do adultério de sua esposa.Encontra-se uma diferença na construção literária do antigo oriente próximo e a literatura do antigo Israel. No primeiro caso falava-se sempre positivamente da capital, e no segundo, a capital podia ser descrita positivamente (ex: a amada, Sión) ou negativamente (prostituta). A descrição dependia do que os profetas queriam metaforizar; humilhar ou despertar simpatia. Naum faz uso deste recurso literário para falar do julgamento de Nínive. Trata-se da capital de uma nação estrangeira. Utiliza para tal situação a imagem da “prostituta”, da “feiticeira”, o que eqüivale a uma conduta sexual inadequada. Nestes versos (3:3-5) há boa reflexão sobre a mentalidade dos profetas em relação à conduta sexual feminina. Em Naum, como em boa parte dos profetas, não falta o uso de imagens femininas. Assim., eis a imagem feminina tipificando o pecado de Nínive! É evocada, mais uma vez, a imagem das “más meninas”, com o símbolo da prostituta. Nínive é uma prostituta! Estes versos utilizam-se da imagem feminina provocativa para personificar a cidade que considera politicamente má e perversa. A imagem da prostituta denuncia condutas profanas, e má da cidade. Portanto é Nínive como uma mulher sexualmente depravada e, por isso, é condenada. Veja que a prostituta é o jeito de falar do comportamento social e político de Nínive. Também, tipifica uma relação onde os princípios de poder da propriedade, da possessão e da pureza estão em perigo. Que melhor estratégia para legitimar o justo castigo de Deus ?
ELEMENTOS TEOLOGICOS: CAP.1: BONDADE - Nínive, capital da Assíria, era nos dias de Naum a maior cidade do mundo conhecido. Uma leitura comparativa de Jonas e Naum demonstra a bondade de Deus em Jonas e a severidade de Deus em Naum. Observar em especial 1:2-3 e 1:6-8. Torna-se interessante comparar Naum 1:5 com Isaías 52:7 e com Romanos 10:15.“Quando ele se aproxima os montes tremem e as colinas se derretem. A terra se agita na sua presença, o mundo e todos os que nele vivem” (Na 1:5)“Como são belos nos montes os pés daqueles que anunciam boas novas, que proclamam a paz, que trazem boas notícias, que proclamam salvação, que dizem a Sião: “O seu Deus reina!” (Is 52:7)“E como pregarão, se não forem enviados? Como está escrito: “Como são belos os pés dos que anunciam boas novas!” (Rm 10:15)
CAP.2: JUSTIÇA - Através do profeta Jonas, Deus havia revelado a sua longanimidade, mas Naum foi usado para anunciar um outro tipo de ensino sobre as atitudes de Deus. Naum nos fala sobre o poder de Deus, um poder que liberta a nação de Judá (1:13). Mediante o exemplo de Nínive aprendemos sobre um lado dos atributos Divinos, Deus promove justiça, porque Ele é justiça. Deus demonstra este atributo quando livra o inocente (Judá), condena o ímpio (Nínive). Isto significa que Deus é justo em tudo o que faz, Ele castiga o mal e recompensa o bem, não tendo favoritos. As razões do julgamento de Nínive são descritas nos vs. 4-6 do cap.3, onde os pecados da cidade-capital são a causa de seu julgamento. Nínive cai no ano 612 a.C., de acordo com a profecia de Naum. A sua destruição foi tão rigorosa que no século II da nossa era a sua localização era incerta.

CAP.3: SOBERANIA DE DEUS - Naum caracteriza-se aqui por declarar a soberania universal de Deus; Deus é o Senhor da história e de todas as nações – e continua hoje também desta maneira. Como tal Ele controla os destinos das nações, e em seu devido tempo, será manifestado este destino de cada nação. Ao pensarmos como os ímpios florescem e dominam os inocentes, sabemos que Deus se comprometeu de aplicar sua justiça a todos aqueles que praticam o mal.
2.2 ASPECTOS MISSIOLÓGICOS: Em um segundo momento podemos inferir que, o aspecto missiológico do livro está na pessoa do profeta Naum, que como instrumento de Deus anuncia a aplicação do justo juízo de Deus contra a cidade de Nínive, mas por conseqüente a libertação do povo de Judá da opressão ninivita. Esta configuração de libertação está implícita no cap. 1:15, onde a aproximação do mensageiro de “boas novas”, cujos pés pisam “nos montes” de Judá, inicia um novo período de dedicação agradecida ao Senhor. As boas novas são resumidas na significante palavra “paz” (heb. Shalom), que indica não apenas o fim da hostilidade mas também o retorno às condições normais abundantes de vida e de bem estar geral.
LIBERTAÇÃO: Na história do Antigo Testamento vemos Deus agindo em favor do seu povo, foi assim na história da libertação de Israel no Egito, também na história do livro de Ester quando os Judeus foram preservados da destruição total promovida por Hamã. No livro de Naum não é diferente, Deus julga e condena Nínive, a grande opressora de Judá e através do profeta convida o seu povo a “celebrar novamente as suas festas pois nunca mais o perverso a invadirá” (Na 1:15). Devemos nos lembrar em primeiro lugar que a cidade de Nínive era uma potência mundial, dominava militarmente, politicamente e economicamente as nações por eles conquistadas. Uma das características do governo ninivita era a opressão através do seu poderio causando medo, pobreza, malefícios sociais. Nota-se também a exploração econômica que Nínive exercia sobre os povos vizinhos, pois quando praticavam o comércio buscavam constantemente tirar proveito de sua condição de império dominante, impondo condições de compra e venda que melhor lhes favorecia em detrimento das demais nações, principalmente sobre Judá (Na 3:5,6). A manifestação do juízo de Deus a Nínive revela os aspectos missiológicos de Deus para Judá, trazendo libertação do sistema opressor.
AS BOAS NOVAS: O juízo de Deus está relacionado com a Torá, onde se revela o maior que vem em favor do menor. Deus ao elaborar suas leis em favor de uma sociedade justa, pensa na igualdade das classes sociais. No antigo Israel a Torá tinha duas finalidades: para aquele que detém o poder, ela é a lei que impõe limites nas atividades sócio-econômicas; já para a classe trabalhadora, a Torá representava as Boas Novas, que promovia o equilíbrio social (Ex 23:10,11 / Ex 22:21-27). Quando Naum usa a expressão “Boas Novas” (Na 1:15), o profeta está trazendo à memória do povo de Judá notícias da intervenção divina na história, promovendo a paz, o bem estar social para um povo que vivia sob o domínio maquiavélico do inimigo.
QUAIS PROBLEMAS O PROFETA ESTAVA APONTANDO? Assíria nesses dias vivia num estado de tal impiedade que sua queda imediata era a única opção justa para Deus. Os reis desse país eram temidos pelos outros povos por sua brutalidade, crueldade , agressividade e vil idolatria, açoitavam seus prisioneiros até o ponto de arrancar a sua pele, que eram depois usadas como ornamentos nos seus castelos e templos. Isto era uma entre muitas outras atrocidades que Naum está profetizando sobre a cidade. A Assíra é considerada como instrumento de castigo que o Senhor enviou contra o seu povo, em 720 no Reino Norte. Mas Assíria ultrapassou a missão que foi confiada , e deve por sua vez ser castigada. Nessa visão do profeta Naum, Nínive, símbolo de poder assírio, adquire conotação do mal, onde ela se torna a concentração do mal, do inimigo de Deus. Naum denuncia uma relação de erros contra a Assíria. Nesses versículos o profeta ressalta as razões pelas quais Deus está derramando seu juízo.
• É uma cidade sanguinária e cruel (3:1)
• É uma cidade que esta cheia de mentira (3:1)
• É uma cidade semelhante a um covil de leões (2:11)
• É uma cidade imunda, cheia de prostituição e feitiçaria ( 3: 4,4)
• É uma cidade que se julgava melhor e mais forte que outras grandes cidades (Nô-Amom ou Tebas , no Egito), que a própria Assíria conquistou (311-13)
• É uma cidade cheia de crimes (3:1-7)

Naum termina a sua profecia falando do sono fatal dos líderes da Assíria . Os pastores dormem (3:18), isto é, estão mortos; por isso as ovelhas correm confusas, sem direção ou sem rumo. Os nobres também estão mortos e não há quem possa por a casa em ordem . A doença, o câncer nesse caso, era incurável. Não havia nada que pudesse evitar a derrocada da grande capital, que já uma vez tinha experimentado a misericórdia de Deus. Os babilônios, instrumentos do Senhor, para esta sua vingança, vieram contra a Assíria no ano 612 a.C e Nínive foi destruída e nunca mais na história da humanidade, levantou-se novamente.
QUAL FOI SUA PROPOSTA PARA A SOLUÇÃO DOS PROBLEMAS?Para Nínive o profeta não apresenta uma solução, pois no passado o profeta Jonas já havia conclamado o povo daquela cidade para um arrependimento diante de Deus. Naquela oportunidade a mensagem de Jonas teve êxito, a cidade se converteu à mensagem de concerto (Jn 3, 5- 9). Passados 200 anos deste fato, Deus envia o profeta Naum com uma nova mensagem para Nínive, uma mensagem oposta de Jonas. A mensagem de Deus já não possui um caráter de arrependimento, mas sim de juízo, pois o povo voltou às práticas pecaminosas que afrontaram ao Senhor. Para Nínive não havia mais esperança, mas o julgamento de Nínive beneficou à Judá, livrando aquela nação do jugo opresssor praticado pelos ninivitas.
QUAL A RELEVÂNCIA DESTE LIVRO PARA MISSÃO DA IGREJA?A dimensão do significado da profecia de Naum para os dias de hoje podem ser listados da seguinte maneira:
• Temos que reconhecer a existência do mal na cidade; não há como fugir desta realidade.
• Temos que crer que Deus se opõe veementemente a toda espécie de mal; Deus, apesar de longânimo, tem seus limites para o pecado.
• É nosso dever examinar a nossa atitude com relação à opressão e entender que a opressão semeia sua própria destruição;
• Deve ser nota característica do salvo hoje na cidade, a busca da implantação do Reino de Deus através da missão integral.
• Somos encorajados a contextualizar nossa visão do poder soberano de Deus na cidade controlada pela experiência política.
• Somos admoestados a resistir à tentação de viver apenas pelas normas sociais do que pela Palavra de Deus.
• É nossa responsabilidade agirmos baseados na fé em que Deus está de fato envolvido na vida e na história. Doutra maneira estaremos irremediavelmente confundidos com os rumos da história.
• Somos alertados a observar que Deus é um Deus de justiça, não apenas de bondade misericordiosa.
• Nos é trazido à lembrança que as leis de Deus são eternas, permanecem e serão aplicadas em seu devido tempo.
• Finalmente somos relembrados de que Deus governa a vida e a história dos indivíduos, grupos, cidades e nações.

TEOLOGIA DA MISSÃO INTEGRAL

Junho 12th, 2007

TEOLOGIA DA MISSÃO INTEGRAL

SERGIO RIBEIRO

Que é missão integral? O que envolve a missão da Igreja a ponto de investigarmos o que é mito e o que é realidade?. Na procura de respostas para estas e outras perguntas semelhantes é que este estudo veio a lume. Não é um trabalho original e nem exaustivo. Não é original porque missão integral já faz parte da discussão teológica da Igreja há algum tempo. Não é exaustivo porque o número de teólogos, missiólogos e pensadores que têm escrito e palestrado sobre a missão da Igreja, e em seus vários aspectos, é enorme. Um bom exemplo da diversidade da missão integral é o livro A Missão da Igreja, organizado pelo Dr. Valdir Steuernagel em 1994. Nele nada menos que 27 articulistas tratam da missão integral da Igreja. Mas existem muitos outros autores que não aparecem no livro de Steuernagel. Além disso, obras como as de René Padilla e Timóteo Carriker são dignas de nota, conforme observamos no capítulo sobre o conceito de missão integral da Igreja na teologia contemporânea. Por causa dessa variedade de autores foi preciso adotar alguns critérios, vez ou outra mencionados no corpo deste trabalho.
Nosso estudo divide-se em três capítulos principais. O primeiro trata da missão integral como mito e realidade propriamente dito. Os outros dois são uma explanação bíblico-teológica e pragmática do primeiro. Nosso objetivo é mostrar que a Igreja evangélica brasileira só pode ser verdadeiramente missionária quando no desempenho de sua missão integral.

1. O MITO E A REALIDADE DA MISSÃO INTEGRAL DA IGREJA

1.1. O mito da missão integral da Igreja
O que poderíamos denominar de mito ou mitos na missão integral da Igreja? Após relativa pesquisa e análise cuidadosa deste assunto, chegamos à conclusão que dois pontos resumiriam bem o mito de missão integral da Igreja. O primeiro deles estaria relacionado a um debate que perdura já algum tempo na igreja evangélica mundial e na brasileira em particular, a saber, a polarização entre evangelização e a responsabilidade social da Igreja. O segundo mito estaria diretamente ligado à dicotomia humana, isto é, o ser humano considerado em partes separadas ao invés do todo. Alguns fatores que possibilitaram o surgimento desses mitos é o que veremos, também, neste capítulo.

1.1.2. O mito da polarização teológica
Que evangelização e responsabilidade social são verdades bíblicas para a Igreja de Jesus Cristo não há dúvida, ou pelo menos não deveria haver (1). Felizmente, a consciência social da igreja brasileira hoje parece ser maior do que algumas décadas atrás. Entretanto, se por um lado a Igreja vem melhorando em sua visão social, por outro, ainda não amadureceu tanto em sua concepção de missão integral, justamente porque ao se discutir prioridades (estamos falando apenas de evangelização e ação social) a igreja deixa de fazer bem uma e outra coisa.
Evangelização e responsabilidade social devem andar juntas como causa e efeito de uma mesma verdade evangélica. Com isso não queremos dizer que evangelização e ação social devam ser entendidas como sendo a mesma coisa. Por outro lado, também não estamos afirmando que sejam duas coisas diametralmente separadas. “Um ministério integral verdadeiro define a evangelização e a ação social como funcionalmente separadas, mas relacionalmente inseparáveis e necessárias para um ministério integral da igreja” (YAMAMORI, 1998, p. 14).
O relatório da Consulta Internacional realizada em Grand Rapids (EUA), presidida por John Stott em 1982, concluiu que na questão da primazia entre evangelização e ação social “a evangelização tem uma certa prioridade. Não estamos falando em prioridade temporal, mas em prioridade lógica, pois há situações em que o ministério social precisa vir primeiro” (STOTT, 1983, p. 23).
E na prática? Na prática, como aconteceu no ministério público de Jesus, estas duas realidades (evangelização e ação social) são inseparáveis, pelo menos nas sociedades livres, e raramente teremos de optar entre uma e outra. Em lugar de estarem em competição, elas se sustentam e fortalecem mutuamente, numa espiral ascendente de preocupação crescente (STOTT, 1983, p. 23)
A discussão pouco louvável no meio cristão sobre a missão prioritária da Igreja no mundo também levou o comitê de Lausanne a elaborar uma declaração sóbria e amadurecida. Diz assim, em seus artigos, o chamado Pacto de Lausanne: “Os resultados da evangelização incluem a obediência a Cristo, o ingresso em sua igreja e um serviço responsável no mundo” (O PACTO DE LAUSANNE, 1983, IV). E ainda:
Afirmamos que Deus é o Criador e o Juiz de todos os homens. Portanto, devemos partilhar o seu interesse pela justiça e pela reconciliação em toda a sociedade humana, e pela libertação dos homens de todo tipo de opressão. Porque a humanidade foi feita à imagem de Deus, toda pessoa, sem distinção de raça, religião, cor, cultura, classe social, sexo ou idade possui uma dignidade intrínseca em razão da qual deve ser respeitada e servida, e não explorada. Aqui também nos arrependemos de nossa negligência e de termos algumas vezes considerado a evangelização e a atividade social mutuamente exclusivas. Embora a reconciliação com o homem não seja reconciliação com Deus, nem a ação social evangelização, nem a libertação política salvação, afirmamos que a evangelização e o envolvimento sócio-político são ambos parte do nosso dever cristão. (Idem, V)
E mais: “A salvação que alegamos possuir deve estar nos transformando na totalidade de nossas responsabilidades pessoais e sociais. A fé sem obras é morta” (Idem, V).
Evangelização e responsabilidade social são partes integrantes da missio Dei, portanto, inseparáveis e indispensáveis na missão integral da Igreja de Jesus Cristo no mundo e para o mundo (2). Façamos, a seguir, uma rápida apresentação de dois grandes movimentos que contribuíram negativamente para o distanciamento da Igreja de sua missão integral.

1.2. O evangelho social e a teologia da libertação
A influência perniciosa e nefasta do liberalismo teológico do século XX, em particular das teologias do evangelho social e da libertação, foi um dos fatores que colaboraram para a polarização entre evangelização e a ação social no meio evangélico. O esforço de se combater a teologia do evangelho social e depois a teologia da libertação (por causa da ênfase social à parte do evangelho bíblico e de uma filosofia marxista, principalmente desta última), provocou um mal-estar na igreja brasileira. Resultado: No afã de se preservar o espiritual, a Igreja acabou se equivocando e não enxergou a mensagem social autêntica que o mesmo evangelho oferecia.
Se de um lado as teologias liberais mencionadas cometeram o pecado do social sem espiritualidade, a igreja evangélica brasileira, por outro lado, pecou na espiritualidade sem encarnação. Contudo, há de se admitir que, por sua vez, tanto o evangelho social quanto a teologia da libertação provocaram uma reação positiva na Igreja. A Igreja foi levada a refletir seus valores, dando uma reviravolta considerável nessa história toda. Hoje em dia, boa parte das igrejas brasileiras está envolvida em trabalhos sociais, e sem qualquer preocupação de ser rotulada e perseguida por isso, como ocorria em tempos atrás.

1.2.1. O mito da dicotomia humana
Ver o indivíduo completo, não dictomizado, é uma necessidade urgente em nossos dias, conforme veremos no decorrer deste estudo. Um dos maiores males cometidos na igreja evangélica brasileira de hoje é limitar o conceito de salvação, achando que Cristo veio salvar apenas a alma do homem ou da mulher. O ser humano - homem ou mulher - é um todo e deveria sempre ser visto assim, como o é pela Bíblia. Partindo da perspectiva bíblica, o ser humano poderia ser definido como sendo ‘uma comunidade integrada de corpo e alma’ (STOTT, 1989, p. 38). Entretanto, a ausência da compreensão do indivíduo como ser integral, pela própria Igreja, tem levado a mesma a desvalorizar não somente o ser humano na sociedade, como também o próprio evangelho para o qual ela foi chamada a proclamar no mundo, pois, como salientou muito bem Manfred (1987, p. 59), “só existe fidelidade na evangelização quando existe fidelidade na missão integral da igreja”. Veremos a seguir que pelo menos três fatores contribuíram negativamente para o surgimento do mito da dicotomia humana, isto é, o platonismo, a influência missionária européia e norte-americana e a teologia sistemática.

1.2.2. A influência missionária e da teologia sistemática
Norman L. Geisler (1985, p. 154) observa que parte do descuido do “homem total” tem sua origem na ênfase platônica não-cristã sobre a dualidade do ser humano. “Esta ênfase foi dirigida pelos cristãos na Idade Média e tem sido transmitida para o presente”. Em síntese o platonismo argumenta que o ser humano é essencialmente um ser espiritual e que apenas tem conexão funcional com um corpo que, na melhor das hipóteses, é um impedimento e, na pior, um grande mal. A correção deste erro está no ensino bíblico acerca da unidade essencial do ser humano.
Além da influência platônica, os missionários europeus e norte-americanos que aqui estiveram parece que não conseguiram passar adiante a idéia da missão integral. Nossa herança missionária é deveras espiritualista. O que é facilmente percebido nas mensagens bíblicas e hinos que os missionários nos legaram. Porém, isso não quer dizer que não houve qualquer tipo de envolvimento social, pelo contrário, a história da igreja brasileira registra dignos exemplos de missionários como Robert e Sarah Kalley, Ashbell Green Simonton e outros, que desempenharam um papel social muito grande em nosso país. Mas então, por que a igreja evangélica brasileira de modo geral não herdou a totalidade da visão desses bons exemplos de missionários, e durante tanto tempo vem caminhando lentamente na questão social? Pelo menos por três razões principais: Uma delas tratamos há pouco, isto é, a omissão da Igreja, até hoje sentida, por causa daquela reação ao evangelho social e à teologia da libertação. Outra razão é que a maioria dos missionários estrangeiros que aqui chegaram tendia para a corrente do evangelho individual (KRIEGER, In Teses,1988, pp. 39,40). Isso explica, embora não justifique, é claro, nosso espiritualismo desencarnado no campo social; o que, de certa forma, contribuiu para a difusão do evangelho social e principalmente da teologia da libertação em nosso país. Uma terceira razão foi observada pelo missiólogo norte-americano Timóteo Carriker, quando diz que boa parte dos missionários europeus e norte-americanos que aqui estiveram “realizaram o trabalho, ora nobre e sacrificial, ora dominador e paternalista, mas, com caríssimas exceções, não transmitiam a mesma visão missionária para as igrejas autóctones. Assim, deixaram a impressão de que missões é coisa que o Brasil recebe e não que faz (CARRIKER, 1993, p. 55).
Outro fator que infelizmente tem colaborado para a dicotomia humana é a teologia sistemática, independente de sua linha confessional. Embora a teologia sistemática seja uma tentativa interessante de organizar em um ou mais compêndios conceitos e pensamentos religiosos variados, é preciso ter cautela com a mesma. Bruce A. DEMAREST, em seu artigo Teologia Sistemática (In EHTIC1990, p. 515), faz uma advertência importante:
Alguns consideram a teologia sistemática como um depósito eterno e inalterável de verdades divinas. Embora as Escrituras sejam invioláveis, novos entendimentos teológicos e reformulações são necessários a cada geração. Primeiro: porque à medida que a linguagem e as formas culturais mudam, o conjunto da verdade cristã deve ser vestido em roupagens contemporâneas a fim de permanecer inteligível; e segundo: porque novas questões e problemas continuam a surgir para desafiar a igreja. Por isso, de tempos em tempos, o texto bíblico precisa ser reinterpretado e reaplicado ao contexto moderno.
No estudo da natureza do ser humano na teologia sistemática, na análise da questão corpo, alma e/ou espírito, e em seus conceitos dicotômicos e tricotômicos, perdeu-se de vista a perspectiva bíblica de que somos um todo. E, certamente, isto tem sido um dos fatores prejudiciais na compreensão da missão da Igreja.

1.3. A realidade da missão integral da Igreja
Em contrapartida ao mito da teologia de missão integral da Igreja, destaquemos dois fatores que, em nossa opinião, expressam bem a realidade dessa missão.

1.3.1. A missão da Igreja é holística e diaconal
Por mais óbvia que pareça esta afirmação, sabemos que a ortopraxia da missão integral não é tão óbvia como deveria ser. Não é fácil inculcar na cabeça do nosso povo que o envolvimento da Igreja deve ser total. Não só no que se refere ao indivíduo, mas também à criação de Deus em geral. Onde está, por exemplo, a consciência ecológica da Igreja? (4). Além disso, a Igreja como sal da terra e luz do mundo deve fazer a diferença nos vários setores da sociedade, principalmente no socorro aos menos favorecidos.
A injustiça social, verdadeira afronta contra a imagem e semelhança de Deus, tem solapado nosso país e a Igreja muitas vezes tem se afastado como se nada tivesse com isso. É verdade que a Igreja não é uma instituição político-partidária que deva defender qualquer bandeira política. É mais que isso. Ela é uma instituição divina supra partidária. Por isso mesmo, tem o dever ético e moral de ser mais justa do que qualquer governo ou partido político pretenda ser. Conforme salientou Jorge GOULART (1941, p. 229), a Igreja “não prega uma forma de governo, mas cria uma consciência democrática, à luz dos conceitos de liberdade, de dignidade humana, de respeito ao próximo e, sobretudo, de amor a Deus e à humanidade”.
Os cristãos foram postos no mundo para ser a consciência da sociedade, como diria Orlando COSTAS (1979, p. 102). A Igreja deve ser a voz do que clama no deserto a fim de fazer a diferença no mundo. Precisa deixar o monte da transfiguração (entenda-se contemplação) e descer até ao sopé onde se encontram os excluídos. Uma opção preferencial pelos pobres? E por que não? O evangelho é para todos, porém, somente o pobre precisa ser atendido também em suas necessidades básicas prioritárias, por causa da má distribuição de renda de nosso país, como resultado de uma política social opressora.
Quando se coloca o pobre e o rico lado a lado, em se tratando de benefícios a serem recebidos, o primeiro sempre sai perdendo. É preciso sim que os pobres desse mundo recebam um tratamento preferencial porque foi assim que Deus os tratou na Bíblia, como veremos mais adiante.
Orlando Costas via nesta dimensão diaconal ou encarnacional da Igreja “a intensidade de serviço que a igreja presta ao mundo, como prova concreta do amor de Deus” (COSTAS, 1994, p. 113). E ainda:
Esta dimensão envolve o impacto que o ministério reconciliador da igreja exerce sobre o mundo, o seu grau de participação na vida, conflitos, temores e esperanças da sociedade e a medida em que seu serviço ajuda a aliviar a dor humana e a transformar as condições sociais que têm condenado milhões de homens, mulheres e crianças à pobreza. Sem esta dimensão a igreja perde sua autenticidade e credibilidade, pois somente na medida em que conseguir dar visibilidade e concreticidade à sua vocação de amor e serviço ela pode esperar ser ouvida e respeitada. (COSTAS, 1994, pp. 113,4).

1.3.2. A missão da Igreja é bíblica
Quando dizemos que a missão integral da Igreja é bíblica, significa que ela (a missão integral da Igreja) não é uma filosofia cega ou um modismo passageiro. A missão da Igreja não é filosofia e muito menos modismo. É uma verdade bíblica que precisa ser resgatada e praticada em sua totalidade. A Bíblia não existe para o deleite de nossa mente carnal. A Bíblia não incentiva nenhum blá-blá-blá teórico desinteressado. A Bíblia é doutrina e prática. A opção por apenas um desses seus aspectos (doutrina ou prática) causará profunda ojeriza em Deus. Sua Palavra é um todo, como um todo deve ser a missão integral de Sua Igreja.
A integralidade da Igreja é bíblica e se baseia na missão integral de Deus. A missão integral da Igreja é ampla, assim como é ampla a missão integral de Deus, visto que a dimensão dessa missão é vertical e horizontal. O compromisso da Igreja com Deus (vertical) resulta nela um compromisso com a criação em geral e com o ser humano em particular (horizontal). Não é por acaso que GRELLERT (1987, p. 22) resumiu a missão intergral da Igreja em “comunhão, adoração, edificação, evangelismo e serviço”.
No capítulo 2 desse estudo falaremos um pouco mais sobre a base bíblica da missão integral da Igreja.

2. A BASE BÍBLICA E TEOLÓGICA DA MISSÃO INTEGRAL DA IGREJA

2.1. A missão integral na Bíblia
A missão integral tem raízes bíblicas profundas. Tetsunao YAMAMORI (1998, p. 15) salienta: Tanto no Antigo como no Novo Testamentos a Bíblia ordena à igreja que ministre à pessoa como um todo. Isto quer dizer que se deve atender tanto às necessidades físicas como às espirituais, que estão inseparavelmente relacionadas, ainda que sejam separadas em termos funcionais.
No capítulo anterior mencionamos que a missão integral da Igreja é ampla. Isso é verdade. Por isso mesmo nosso objetivo agora será tratar, à luz da Bíblia, apenas de um dos aspectos da missão integral, isto é, aquele que está diretamente relacionado à pessoa do indivíduo ou, mais especificamente, aos pobres deste mundo. “Nada é mais claro na Bíblia do que ser Deus o campeão dos pobres, dos oprimidos e dos explorados”. (BRYANT, 1988, p. 56).
Segue abaixo uma abordagem resumida sobre o assunto.

2.1.1. No Antigo Testamento
Se folhearmos as páginas do Antigo Testamento veremos que existe uma clara opção preferencial de Deus pelos pobres e oprimidos. Isto não significa que Deus faça acepção de pessoas ou de classe social. De modo algum! Mas com certeza Ele olha de maneira especial para aqueles que não têm vez, que não têm voz. Só no AT nós temos 300 referências sobre causas, realidade e conseqüências da pobreza. Vinte e cinco palavras hebraicas para falar do oprimido, do humilhado, do desesperado, do que clama por justiça, do fraco, do desamparado, do destituído, do carente, o pobre, a viúva, o órfão, o estrangeiro. Em Isaías 58.3-8, quando o povo de Deus pergunta: “Por que é que nós oramos e jejuamos e tu não nos respondes?”, Deus diz: “É porque vocês jejuam e oram para a iniqüidade, vocês estão oprimindo os pobres, e seus próprios operários, e o jejum que eu quero, é que vocês cortem as ligaduras da impiedade, é que ajam com justiça em relação aos desamparados”. Veja também Isaías 1.17; 10.1,2.
Ezequiel 16.49 afirma que o pecado de Sodoma, além do orgulho, da vaidade e da imoralidade era que aquela cidade, sendo rica e abastada, nunca atendeu o pobre e o necessitado. Se olharmos na legislação do povo de Deus no Velho Testamento, veremos que o objetivo de toda a legislação era que não houvesse miseráveis e injustiçados no meio do povo de Israel.

2.1.2. No Novo Testamento
Jesus Cristo é a revelação máxima da missão integral de Deus no mundo. No início de seu ministério terreno o Senhor Jesus deixou bem clara a sua missão quando declarou: “O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar libertação aos cativos e restauração da vista aos cegos, para por em liberdade os oprimidos, e apregoar o ano aceitável do Senhor” (Lc 4.18,19). O cuidado de Jesus com os pobres e marginalizados é enorme. “Nós nunca encontramos Jesus Cristo de dedo apontado contra os pobres e marginalizados, mas enfrentando exatamente aqueles que oprimiam o povo, quer pelo sistema religioso, quer pelo sistema econômico, ou sistema político de sua própria época”. (MACEDO FILHO, 1988, p. 35).
Em Mateus 4.23 lemos também: “Percorria Jesus toda a Galiléia, ensinando nas sinagogas, pregando o evangelho do reino e curando toda sorte de doenças e enfermidades entre o povo”. E ainda em Mateus (cap. 25) notamos que além da questão do se “fazer igualmente a Cristo”, a nossa atitude para com os desfavorecidos deste mundo será um critério importante de julgamento no Juízo Final.
Os apóstolos deram continuidade ao tema da missão integral de Jesus em seus ministérios. Veja por exemplo Atos 5 e 6. Em Jerusalém as três colunas do colégio apostólico (Pedro, Tiago e João) recomendaram a Paulo e a Barnabé que não se esquecessem dos pobres, “o que também me esforcei por fazer”, diz o apóstolo em Gálatas 2.10. Várias igrejas foram orientadas por cartas a agirem com a mesma visão de integralidade bíblica dos apóstolos. Destacamos, dentre outras, as igrejas de Corinto (II Co 8 e 9), da Galácia (Gl 6.2-10) e das doze tribos da dispersão (Tg 2. 1-7,14-26; 5.1-6).

2.1.3. A missão integral na teologia contemporânea
O número de teólogos que escreveram e escrevem sobre a missão integral da Igreja não é pequeno. Um bom exemplo disso é a obra do Dr. Valdir Steuernagel em que ele reúne nada menos que 27 autores. Falar do trabalho de cada um desses autores, sem considerar outro tanto que Steuernagel não menciona, seria simplesmente impossível para as dimensões do nosso trabalho. Estou tomando, então, a liberdade de selecionar apenas dois deles, a saber, Timóteo Carriker e René Padilla, e explico porquê. Em primeiro lugar, nossos dois teólogos são duas das maiores autoridades mundiais sobre a missão integral da Igreja. Em segundo lugar, cada um deles escreveu um livro com o mesmo título (Missão Integral) com cerca de 300 páginas cada. Em terceiro lugar, vale a pena conferir a ênfase e a abordagem distintas que ambos conferem em seus respectivos livros acerca da missão integral da Igreja.

2.1.4. O conceito de Timóteo Carriker
O livro de Timóteo Carriker é uma teologia bíblica de missões. Seu objetivo é ressaltar as diversas dimensões, na palavra de Deus, da identidade e tarefa missionárias do povo de Deus (1992, p. 11). A seguir exporemos alguns dos principais conceitos da missão integral de Carriker. No Antigo Testamento Javé é o Deus soberano sobre toda a sua criação. Esta imagem de Deus está no coração do Novo Testamento também. Um Deus soberano e misericordioso é o ator último das parábolas de Jesus. É este Deus salvador que alcança além das leis judaicas. Sua aproximação do homem exige a atitude de conversão. O seu reino tem um escopo universal até cósmico. Os marginalizados, mulheres, samaritanos, e gentios recebem a misericórdia de Deus.
Deus tem um plano salvífico que alcança tanto judeu quanto gentio, e Ele vai cumpri-lo. A confiança no cumprimento do seu plano dá a igreja motivação para perseverar até o fim. A igreja, contudo, não fica passiva em relação à soberania de Deus. Reconhecer que a missão é essencialmente de Deus, missio Dei, não significa que a participação da igreja na evangelização mundial tem pouca significância. Muito pelo contrário, a missio Dei exige os missiones eclesiae. São praticamente dois lados da mesma moeda. O Deus da Bíblia é o Deus que age na história. Não é principalmente apresentado como um conceito ou idéia, uma doutrina que podemos elaborar. Ele é, acima de tudo, pessoal e age nos eventos e experiências concretas das nossas vidas. Deus não se restringe a uma dimensão mística da nossa vida. Atua através do êxodo, do dilúvio e do cativeiro no Velho Testamento, todos eventos históricos até “seculares”. Ele atua através da vida humana do seu filho Jesus, através da sua morte e ressurreição, eventos bem visíveis que fazem parte da nossa história. É na nossa história humana que Deus se revela e o faz com movimento para frente. Percebemos, através da história, a sua conclusão. Assim, a perspectiva cristã da história é essencialmente escatológica. A humanidade está indo na direção do cumprimento, julgamento e salvação, e este movimento entrou na sua fase final com a ressurreição de Cristo. Hoje é o dia da salvação.

2.1.5. O conceito de René Padilla
A abordagem de René Padilla é mais teológica e menos bíblica. Por “mais teológica” queremos dizer que os argumentos de Padilla estão mais na área das idéias, o que não diminui, de modo algum, o valor da obra dele. Por “menos bíblica” queremos afirmar que o livro de Padilla não é uma teologia bíblica nos moldes do livro de Timóteo Carriker, porém, seus princípios são eminentemente bíblicos. Apesar de não termos o objetivo de comparar os dois autores, vale ressaltar que as aplicações de Padilla são mais contextualizadas que as de Carriker. Padilla desenvolve seu tratado em termos de desafios. Diz ele que o maior desafio que a igreja enfrenta atualmente é o desafio da missão integral (1992, p. 139). O desafio da missão integral, por sua vez, subdivide-se em outros três, a saber: O desafio da evangelização e do discipulado, o desafio da colaboração e da unidade e o desafio do desenvolvimento e da justiça. Seus argumentos principais são os seguintes:
Um conceito um tanto romântico da obra missionária impulsionou as missões a concentrarem seu esforço em pequenas tribos nas selvas, esquecendo-se das cidades. A “explosão urbana” é um fenômeno mundial. A missão urbana, portanto, é uma prioridade em todas as partes. Lá, na cidade, com todo seu poder desumanizante, vê-se com clareza a necessidade de um evangelho com poder para transformar a totalidade da vida. Num mundo que está se urbanizando rapidamente, a cidade é, sem dúvida, o símbolo do desafio que a evangelização e o discipulado colocam para a igreja. Porque há um mundo, uma igreja e um evangelho, a missão cristã não pode ser outra coisa que missão realizada em colaboração mútua. Chegou o momento de encontrar maneiras de reduzir a distância entre as igrejas no Ocidente e no Terceiro Mundo. Já há experiências úteis que estão sendo levadas a cabo com este propósito, mas é necessário fazer muito mais para desenvolver modelos de solidariedade acima das barreiras políticas, econômicas, sociais e culturais, e para estimular a colaboração mútua entre as igrejas.
O desafio que a igreja encara no campo de desenvolvimento hoje é fundamentalmente o desafio de um desenvolvimento humano, no contexto da justiça. Fazem falta modelos de missão plenamente adaptados a uma situação marcada por uma distância abismal entre ricos e pobres. Os modelos de missão baseados na riqueza do Ocidente solidarizam-se com esta situação de injustiça e condenam as igrejas do mundo pobre a uma permanente dependência. No final das contas, portanto, são contraproducentes para a missão. O desafio tanto para os cristãos no Ocidente como para os cristãos nos países subdesenvolvidos é criar modelos de missão centrados num estilo de vida profético, modelos que apontem para Jesus Cristo como Senhor da totalidade da vida, à universalidade da igreja e à interdependência dos seres humanos no mundo.

3. OS DESAFIOS E IMPLICAÇÕES DA MISSÃO INTEGRAL DA IGREJA

3.1. Desafios da missão integral da Igreja

Observamos no capítulo anterior que René Padilla apresenta a missão integral da Igreja em termos de desafios. Entretanto, sua abordagem é ampla, no sentido de envolver a missão da Igreja num âmbito mundial ou, no mínimo, na América Latina. Os desafios que agora mencionaremos tratam da igreja brasileira em solo brasileiro. Dividimo-nos em duas partes distintas, isto é, os desafios sociais e os desafios eclesiais.

3.1.2. Os desafios sociais da Igreja
Não são poucos e nem pequenos os problemas sociais brasileiros. A igreja evangélica brasileira tem desafios enormes nesta área. Porém, de início é preciso que encaremos com seriedade e maturidade o dilema de até onde podemos e devemos nos envolver nestes desafios. Que a igreja evangélica brasileira não deve se esquivar de sua missão integral, é o nosso comum acordo com a declaração de Lausanne: Embora a reconciliação com o homem não seja reconciliação com Deus, nem a ação social evangelização, nem a libertação política salvação, afirmamos que evangelização e o envolvimento sócio-político são ambos parte do nosso dever cristão.
É preciso sim que a Igreja seja a consciência da sociedade e a voz profética que denuncia os desmandos desta mesma sociedade. Não devemos, como Igreja de Cristo, partir para a ignorância e violência, mas podemos e devemos fazer confrontações sociais sérias. Confrontação não é violência. Robert C. Linthicum (1996, pp. 171,2) explica: Há muita confusão sobre a natureza da confrontação e da violência. Confrontação é simplesmente a atividade entre seres humanos na qual eles discordam, e devido a esta discordância, estão desafiando uns aos outros. A palavra significa literalmente “testa-a-testa” - isto é, as testas colocadas fisicamente uma contra-a-outra. É um encontro face a face, direto, procurando o fim da resolução.Por outro lado, violência é o exercício da força física, a fim de ganhar uma disputa. Enquanto a confrontação é verbal, a violência é física. De uma forma mais profunda, essas palavras não são sinônimas, e sim antônimas, pois, em sua própria natureza, um ato de violência é a indicação de que a confrontação falhou. A confrontação boa e eficaz nunca deve levar à violência, mas à resolução do problema.
É nesse espírito de verdadeira confrontação que a Igreja deve encarar seus desafios sociais, com propostas terapêuticas para uma sociedade enferma. Portanto, empenhemos-nos pela dignidade do povo brasileiro. Reivindiquemos, pois, os seus e os nossos direitos: Saúde, segurança, educação, trabalho e salário digno. E até onde podemos e devemos ir nesta questão toda? Até onde os direitos sejam verdadeiramente assegurados, o amor ao próximo evidenciado, a moral dignificada, o evangelho e o bom testemunho não sejam prejudicados e, sobretudo, o nome de Jesus seja glorificado.
O governo tem (e como tem!) suas culpas e responsabilidades, mas não podemos ficar indiferentes ao que ocorre em nossa volta, simplesmente criticando por criticar o governo. Pesa (e como pesa!) sobre o povo de Deus também a responsabilidade pelo bem-estar social do nosso país.

3.1.3. Os desafios eclesiais da Igreja
Certamente um dos maiores desafios da igreja brasileira na atualidade é vencer seus próprios desafios. Tentarei explicar esta minha tese. Os desafios sociais da igreja brasileira não são combatidos e vencidos como deveriam porque falta vontade eclesiástica por parte da mesma. Ou porque a liderança não se empenha, ou porque os liderados não se envolvem na obra. O certo é: Se não chegarmos a um consenso; se não juntarmos forças, jamais sairemos do lugar comum. Continuaremos marcando passo, salgando a nós mesmos e iluminando nossos umbigos.
Uma lição é preciso aprender com a igreja de Jerusalém. A igreja de Jerusalém estava consciente de sua missão no mundo. Era uma igreja unida em seus propósitos e se amava de verdade. Internamente ela estava pegando fogo, desejosa de pregar o evangelho, em obediência ao mandado de Cristo. Porém, externamente os desafios eram humanamente insuperáveis. Pilatos, Herodes e muita gente se levantaram contra a Igreja de Deus. Então a Igreja orou: “agora, Senhor, olha para as suas ameaças e concede aos teus servos que anunciem com toda a intrepidez a tua palavra, enquanto estendes as mãos para fazer curas, sinais e prodígios por intermédio do nome do teu santo Servo Jesus” (At 4.29,30).
E Deus atendeu ao clamor de sua Igreja (At 4.31). Atendeu porque a Igreja deixou de lado seus próprios interesses para servir ao mundo. Hoje, o que muito se vê, à nível de igreja local, é a própria igreja criando obstáculos para não fazer a obra do Senhor. Externamente desfruta-se de uma liberdade religiosa como nunca se viu, mas internamente muito de nossas igrejas estão enfermas, quando na verdade eram elas que deveriam estar curando!. A seguir daremos duas sugestões práticas para que esse quadro sombrio possa se reverter.

Implicações da missão integral da Igreja
As implicações que aqui abordaremos não deixam de ser verdadeiros desafios para a igreja brasileira, porém, entendemos que estes desafios são implicações naturais para uma igreja que queira verdadeiramente cumprir sua missão integral.

3.1.5. A revisão de estruturas não-funcionais
O que muito tem contribuído para um mau desempenho da Igreja em sua missão integral é a falta de estruturas que funcionem. Estruturas enrijecidas pelo tradicionalismo matam ou impedem a visão de uma igreja. A quebra de paradigmas é uma das coisas fundamentais para que a estrutura de uma igreja se torne funcional. Às vezes é preciso muita coragem para mudar certos parâmetros que já não funcionam mais. À primeira vista parece fácil mudar aquilo que se tornou obsoleto, mas não é tão simples assim. Antes é preciso mudar a mentalidade dos acomodados e principalmente dos saudosistas, daqueles que confundem inovação com inovacionismo, tradição com tradicionalismo. O que está “matando” muito crente novo (e velho também) é a igreja não-funcional, que se limita a suas atividades internas, fechada em quatro paredes.
Contudo, por uma questão de prudência e respeito àqueles que não pensam como nós, é preciso que os paradigmas sejam quebrados aos poucos. As idéias devem ser amadurecidas no meio da comunidade, sem atropelos, mas progressivamente. Uma coisa aprendi em meus poucos anos de ministério pastoral: Se a igreja não comprar a nossa idéia, não será por meio de decreto conciliar que conseguiremos qualquer êxito. Um diálogo franco, aberto e amigável é a chave do sucesso.

3.1.6. A reafirmação do compromisso missionário
Aquelas igrejas que um dia receberam orientação missionária, se não forem constantemente lembradas daquele compromisso, rapidamente minguarão. E como revitalizar uma igreja que começou com tanto entusiasmo por missões e de repente esfriou? Em primeiro lugar é preciso reconscientizar a igreja de sua missão no mundo. Em segundo lugar é preciso conscientizá-la de que ela está no mundo para servir o mundo integralmente. Se a igreja chegou a se empolgar com missão algum dia, é sinal que ela tem potencial para fazer, com a graça de Deus, o que fez antes. Sermões e estudos bíblicos missionários, filmes específicos como As Primícias, Etal e Atrás do Sol, além do auxílio de uma boa agência ou junta missionária, com certeza produzirão novo alento. Geralmente a frieza por missões acontece por causa da rotina. Uma vez que o mal foi detectado é necessário que seja combatido com atividades variadas.
O mais importante é que a igreja seja cientificada de que sua missão no mundo é integral. Evangelizar não é simplesmente distribuir folhetos como alguns pensam, mas sim, atender o indivíduo na totalidade de suas necessidades. Por isso mesmo, a Igreja nunca deveria deixar se levar pela prática do paternalismo e assistencialismo paliativos, porém, deveria partir sempre para uma ação social transformadora, do indivíduo e da sociedade, para a honra e glória de Deus Pai.
Cada igreja deve refletir sobre sua motivação em praticar evangelismo e ação social, e todas as atividades nestas direções devem estar debaixo do serviço a Deus em primeiro lugar (A. C. BARRO, sem data, p. 5). O ponto de partida é o parâmetro bíblico e o contexto da igreja local.

Conclusão:

A missão integral da Igreja é basicamente evangelização e ação social. Dizemos “basicamente” Porque a missão integral da Igreja é na verdade universal. Abrange vários aspectos. Evangelizar é a sua qualidade primordial. A Igreja que troca a evangelização por qualquer outra responsabilidade social está fora de propósito e, portanto, descaracterizada como igreja de Jesus Cristo. Por outro lado, que nenhuma igreja pense ser mais espiritual porque optou pela evangelização. Concordamos que uma igreja possa fazer uma opção temporária entre evangelizar e assistir ao necessitado, mas nunca uma opção permanente. A verdadeira espiritualidade do povo de Deus se expressa em sua integralidade. A mesma igreja que proclama as boas novas do reino deve ser a mesma que estende a mão ao necessitado.
Missão integral é uma realidade bíblica. Os mitos não fazem sentido quando são resultados baratos de um reducionismo evangélico, polarização entre evangelização e ação social, e quando se deixa de contemplar o indivíduo em sua totalidade. Os mitos (pelo menos os que aqui estudamos) deturpam a missão integral da Igreja. Se queremos atentar para o ensino bíblico, então devemos almejar por uma igreja brasileira autêntica, que não seja ela mesma um mito, mas a realidade bíblica de uma missão integral em nossa sociedade.

Bibliografia
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FÁBIO, Caio. Um projeto de espiritualidade integral. Niterói: Vinde, 1994.
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GRELLERT, Manfred. Os compromissos da missão: A caminhada da Igreja no contexto brasileiro. Rio de Janeiro/Belo Horizonte: Juerp/Mundo Cristão, 1987.
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ZANDRINO, Dr. Ricardo. Curar também é tarefa da igreja. São Paulo: Nascente, 1986.
(1) Veja Manfred Grellert (1987, p. 41).
(2) Para um argumento interessante contra este reducionismo evangélico (a polarização teológica ente evangelização e ação social) veja Manfred Grellert (1987, pp. 41-43).
(3) Veja também MACEDO FILHO (In TESES, 1988, p. 33).
(4) Para uma compreensão importante sobre a responsabilidade da Igreja com a natureza, veja Francis A. Schaeffer (Poluição e morte do homem) e Norman L. Geisler (O cristão e a ecologia).
Rev. Josivaldo de França Pereira - Pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil (I.P.B.) em Santo André - SP. Bacharel em teologia pelo Seminário Presbiteriano Rev. José Manoel da Conceição (J.M.C. - SP), Licenciado em filosofia pela F.A.I. (Faculdades Associadas Ipiranga - SP) e mestrando em missiologia pelo Seminário Teológico Sul Americano (S.T.S.A.) em Londrina - PR

MISSÃO INTEGRAL

Junho 12th, 2007

MISSÃO INTEGRAL

Sergio Ribeiro

Filipense 4: 10-20 registra a testemunho paulino agradecendo a participação solidária dos filipenses ao ministério do apóstolo. Como a solidariedade é marca do testemunho cristão no contexto brasileiro? Segundo Comblim , “Os laços e amizades desenvolvidas entre Paulo e a comunidade cristã de Filipos , foram muito profundos, em pouco tempo soube criar laços tão profundos em Filipos que comunidade ali nascida se tornou seu maior consolo , o maior motivo de gloria do apóstolo” . Esta verdade é vista no vr.15 cap.4, onde Paulo fala“ …nenhuma igreja comunicou comigo no sentido de dar e de receber , senão vos somente” Paulo estando preso , estava sendo alvo do amor e da solidariedade da comunidade em Filipos “ Muito me regozijo no Senhor pois finalmente renovaste o vosso cuidado a meu favor . Já tínheis cuidado a meu favor ,mas vos faltava oportunidade para mostrá-lo FL.4:1. A comunidade ficou comprometida com Paulo no início da missão .Ela assegurava a continuação da missão .Bastava Paulo pedir , e eles mandavam a ajuda . havia uma relação de dar , e receber entre eles , como um verdadeiro contrato missionário .
Este ato solidário da igreja de Filipense é a marca do testemunho cristão, não se pode anunciar o Reino de Deus sem a prática da solidariedade, visto que o anúncio do Reino de Deus implica em ser solidário com os que sofrem. Isto é visível no ministério de Jesus Cristo. Na narrativa de evangelho de Lucas os pobres tem a centralidade do ministério de Jesus ele busca os marginalizados, dos oprimidos, como os cativos, machucados, cegos, surdo, coxos, leprosos, aleijados, morto e para os pobres, todos são vitima desta missão, trazendo assim fundamento da teologia da Missão Integral.
A prática da solidariedade se resume em dar um pouco de mim para o próximo, mas isso só e possível por aquele que sabe amar o próximo, pois aquele que ama tem misericórdia , é solidário; como enfatizou Molthann : “aquele que não pode amar não pode sofrer ”. Estatísticas revela que o Brasil e o segundo pais do mundo no crescimento da desigualdade social, ou seja , quem é rico fica mais rico ,e quem é pobre fica mais pobre .A onde existe pobreza deve ter missão integral. Mas a teologia da América Latina como enfatizou René Padilha , “ainda é muito espiritualizada ” , Leonardo Boff enfatiza “quanto mais metafísicos formos mais difícil será a manifestação Reino de Deus” .
A centralidade da missão da Igreja esta justamente na pratica da solidariedade, fazer justiça para aqueles que não tem. Isto não é um mandamento novo; isso não nasceu com Jesus, vem deste o Antigo Testamento através da Torá. Através da colocação de Neubaruer, entende-se que a “Torá está voltada para o uso do terno “hanan”, visto que as leis contidas visam uma intervenção nas relações sociais, como afirma Crusemann: “Temos na Torá/Lei e a manifestação concreta do evangelho e do Reino de Deus. A lei e a expressão concreta da graça de Deus para os mais fracos” . Em relação ao contexto civil de Israel, há um conflito de interesse entre senhores e pessoas marginalizadas. Percebe-se que nas formulações das leis , há dois destinatários concreto apresentado como “tu”, esse “tu” é o sujeito da lei. Ainda no contexto da Lei temos o que podemos chamar de “objeto da lei”, isto é pessoas forasteiras, órfão, viúvas pobres, são vistas como pessoas e grupos que devem receber o valor e a proteção da lei especifica. As leis de Deus tinham como meta promover o bem estar e igualdade social. Visto que na bíblia temos um Deus que julga, condena, permite juízo, quando existem oprimidos e injustiçados . A centraidade da mensagem dos profetas é promover a justiça, como o caso do profeta Amos, “o projeta social”.
O nosso contexto social econômico mostra uma realidade, um quadro de pobreza é miséria. A missiologia diz que igreja é um agente de transformação, mas para que haja realmente uma transformação a igreja deve ser solidária com os que sofrem. Um dos grandes mal do contexto da América Latina, esta justamente na teologia da prosperidade uma teologia desumana e egoísta, uma teologia que só veio a dar credito a teoria de Max Weber “ A ética protestante e o espírito capitalista ” A Teologia da Libertação e a Teologia da Prosperidade, ambas quase juntas. Mas a Teologia da Libertação, foi ridicularizada com o passar do tempo, porque denunciava a omissão da igreja é do governo. Ao passo que a Teologia da prosperidade cresceu, por ser uma teologia que não dá, mas recebe, também por ser uma teologia que não tira o indivíduo da nossa zona de conforto.

BIBLIOGRAFIA

COMBLIM, J. Cartas aos Filipenses. Petrópolis: Ed. Sinodal, 1985.
BARROS, H. J. De Cidade em Cidade. Londrina: Ed. Descoberta. 2002.
MOLTHMANN. J. O caminho de Jesus Cristo. São Paulo: Vozes, 1980.
BOFF, L.Graça transformadora do mundo. São Paulo: Vozes, 1982.
CRUSEMANN, F. Torá: Teologia e História social da lei do Antigo Testamento .São Leopoldo: Sinodal, 2000.
REINER,H. Tempos de graça: O jubileu e as tradições jubilares na Bíblia. Petropolis: Editora Vozes, 1999.

A MISSÃO URBANA NO CONTEXTO URBANO DE ATOS.

Junho 12th, 2007

TEOLOGIA DA MISSÃO URBANA
ASPECTOS BIBLÍCOS E TEOLOGICOS DA MISSÃO URBANA NA PEPCTIVA DO APÓSTOLO PAULO NO CONTEXTO URBANO DE ATOS.

Sergio Ribeiro

Como poderemos perceber, tanto as motivações quanto as estratégias de missão urbana de Paulo, são de suma importância para a o início ou continuidade de qualquer trabalho eclesial, e não só o que envolva missão urbana. Algum ano após a morte de Jesus despontou um homem chamado Paulo, judeu-fariseu, conhecedor da lei e das escrituras hebraicas e da tradição do povo de Israel, cidadão romano. Ele teve uma experiência de conversão em sua vida, da qual brotou no seu coração a paixão pelo projeto de Jesus. A experiência é a de ser chamado diretamente pelo Senhor. Dessa forma, Paulo compreende sua vocação como contribuição ao anúncio de Jesus. No tempo do Apóstolo Paulo, a religião havia se tornado instrumento de exclusão social das mulheres, escravos e estrangeiros. Paulo entendeu que a salvação era dom gratuito para todos e não apenas para o povo “eleito” de Israel. Entender a verdadeira expressão de um Deus libertador era ter uma vida fraterna que congregasse a todos numa única família. Daí seu apelo de paz e unidade: Já não há mais judeu nem grego, escravo ou livre, e sim homens novos em Cristo. Já não se tinha sentido seguir esta lei. Diferentemente dos caminhos percorridos por Jesus, num ambiente campesino, Paulo instalou-se em centros urbanos importantes. Muito se tem escrito a cerca das cidades. Teólogos freqüentemente questionam se elas são uma realidade de Deus ou de Satanás, se são uma espécie de ensaio divino ou ainda uma luta entre forças que desejam conquistá-las. A Bíblia não deixa ao largo a temática urbana, nela encontramos 1.400 referências à cidade. Não raro, encontramos nessas referências à cidade, a apresentação da mesma como a responsável pelo mal, mal que deve ser visto não apenas como individual, mas como institucional, sistêmico, fruto da ação daqueles que na cidade habitam e dela participam.
Diferenciando as edificações de uma cidade dos seus habitantes, mas ao mesmo tempo reconhecendo que há uma estreita ligação entre ambos, sedimentada pelo fator organização, o homem cidadino torna-se um todo com sua cidade. Ele interage com ela influenciando e sendo por ela influenciado. Isto implica que como resultado desta interação homem-cidade, gera-se um produto construtivo ou destrutivo, e é neste contexto que o relato bíblico, ao evidenciar a ação do homem marcado pelo estigma do pecado, denuncia com freqüência a perversidade e impureza da cidade, ao mesmo tempo que registra o grande amor de Deus em resgatá-la de tal servidão malévola. A igreja se relaciona diretamente com a vida comunitária. Ela vive junto, ora e atua em comum, onde cada um coopera para o bem de todos e através da construção de uma sociedade cristã e justa se deduz qual é o sentido de ser igreja. A missiologia está sempre presente, levando a comunidade eclesial a atuar de modo a obedecer a ordem de seu Senhor, apontando o sentido de sua existência.A força atual da igreja só será medida quando se puser em prática a missiologia, com todos os elementos que ela supõe. Deus decidiu precisar de homens e mulheres para realizar isso de proclamar seu Filho. Por isso, os resgata, os chama, os vocaciona, os capacita e os respalda para essa obra. Esse é o papel da igreja: através da ação polarizadora do Espírito Santo levar as boas novas aos que ainda não ouviram. Ou seja, precisamos conhecer a Deus e torná-lo conhecido. Devemos para isso não medir esforços em aprender com Paulo o seu relacionamentos com a cidades.
A urbanização se trata de um dos maiores fenômenos da humanidade. O mundo deixa de ser rural e passa a cada dia mais urbano. Neste processo de transição a sociedade passa por muitas mudanças. Uma nova cosmovisão começa a fazer parte da personalidade do ser humano urbanos através de novos valores, ideologias, filosofias e comportamentos. O contexto urbano é algo que desperta curiosidade e interesses. Faz se necessário estudar mais e mais o contexto urbano, tanto na perspectiva Bíblica como na perspectivas muldiciplirares da cidade onde se lê a da cidade numa visão sociológica, antropológica, histórica e psicológica para o enriquecimento do ministério. A teologia deve ser contextual. Sendo assim o contexto urbano deve ser entendido e trabalhado teologicamente, para que Igreja possa alcançar as pessoas que estão dentro de um contexto urbano e não se tornar uma igreja alienamante e totalmente descontextualizada do seu contexto voltados para métodos, práticas, conceitos e valores que não se encaixa na realidade urbana presente.
Ao falar das cidades é falar das realizações do homem, de suas inter-relações, dos seus progressos e de seus fracassos. Além disto, a cidade reflete a relação do homem com Deus e com o sagrado. A torre que se começou a edificar-se na recém-construída cidade de Babel (Gn 11:4), além de preconizar o desejo do homem de ser notado e auto-glorificado, retratou a força produtiva do homem quando organizado em comunidade em prol de um objetivo comum. Tal ação “despertou” também a atenção do Criador (Gn 11:5) Na verdade, não podemos deixar de crer que este propósito urbano é bom e agradável a Deus. Contudo, o pecado que deformou o caráter do homem, privou muitas das bênção que a vida em coletividade urbana deveria oferecer, e transformou a vida comunitária em opressão do homem pelo homem, injustiças e vantagens de grupos, prejuízos, sofrimentos e segregação de muitos para benefícios de poucos.
Diante desta centralidade e dependência da cidade para a vida do ser humanos, são vários os objetivos da abordagem da cidade nesta perspectiva bíblica e missiologica. Em perspectivas pessoais, os objetivos desta abordagem de pesquisa é em primeiro lugar conseguir retratar as cidades as quais Paulo em seu ministério trabalha. O qual nos da grande base para um Teologia Bíblica da Missão Urbana. Segundo objetivo esta na perspectiva ministerial, em abordar não de uma forma negativa, mais sim positiva as cidade, na tentativa de construir uma imagem positiva da cidade e consequentemente fundamentar a missão urbana.
Não sendo Deus ausente da história da humanidade, cremos que os nossos registros históricos não acontecem pelo simples querer do homem, nem muito menos por acaso. Deus, ele mesmo é o autor das cidades e de suas histórias. No seu plano eterno estava estabelecido, para o homem, o viver em harmonia e cooperação comunitária. A cidade, portanto, retrata esta realidade de Deus, e é a partir desta plataforma que abordaremos a cidade no contexto urbano de Atos na perceptiva do apostolo Paulo.

ANÁLISE DO CONTEXTO HISTÓRICO DE ATOS
1.1.O império Romano:O Império Romano do primeiro século tinha uma estrutura política onde toda a autoridade estava concentrada nas mãos do imperador. Esse império teve seu início no ano 31 a.C., quando Otávio derrotou Antônio e Cleópatra de Actium, tornando-se então senhor não apenas do Egito de que se apoderou com domínio pessoal, mas de todo o mundo romano. No Ano de 27 a.C., Otávio recebeu o título de Augusto, sob o qual se tornaria divindade romana após a sua morte. Sem possuir rivais políticos no Senado e com o apoio total de seus exércitos, Augusto introduziu profundas reformas no sistema de governo. Após Augusto, surgiram muitos outros imperadores que governavam o império. Ao imperador cabia o direito de nomear magistrado, controlar os exércitos, interferindo, até mesmo nas questões religiosas. O estabelecimento do império foi a solução encontrada para os romanos para que pudessem deter o poder em suas mãos, bem como para evitar os conflitos existentes entre várias facções existente no presente.Existia duas etapas distintas que foram: o alto império do século I a.C. ao século III d.C., e o baixo Império do século III ao século V. Porém, foi no período do alto império que o Roma atingiu seu apogeu, devido ao desenvolvimento sem precedentes do modo de produção escravista, e as conquistas territoriais, alcançando riqueza e poder como nenhuma outra civilização veio a conquistar.

A ENFASE DE PAULO NA CIDADE EM ATOS
2.1. Análise do movimento missionário urbano de Paulo: Deus decidiu precisar de homens e mulheres para realizar isso de proclamar seu Filho. Por isso, os resgata, os chama, os vocaciona, os capacita e os respalda para essa obra. Esse é o papel da igreja: através da ação polarizadora do Espírito Santo levar as boas novas aos que ainda não ouviram. Ou seja, precisamos conhecer a Deus e torná-lo conhecido. Devemos para isso não medir esforços em aprender com Paulo em Atos dos Apóstolos. Em primeiro plano, analisar profundamente o que motivava o apóstolo a pregar o evangelho de cidade e cidade e as estratégias que ele usou para fazer isso. E desta forma, num segundo momento, teremos uma visão clara para ver se podemos ou não usar essas mesmas motivações e estratégias para a transformação da sociedade vigente através da obra redentora e conciliadora de Jesus Cristo, proclamado com profundidade teológica e fervor missionário
2.2. De Jerusalém a Samaria: Jerusalém ocupa tanto um papel simbólico quanto desempenha uma função estratégica como cidade base para o processo de ação missionária. Juan Carlos Ortis, chega a afirmar que Jerusalém foi uma espécie de “capital do império das trevas” e por isto Cristo morreu ali, para dali expandir o Reino. O AT é repleto de alusões a Jerusalém, “ela é retratada como o centro espiritual do mundo, uma cidade modelo vivendo em verdade e fé sob o sacerdócio de Deus (Is 18:8; Mq 4:1; Dt 17;14-20)”. Um aspecto a mais, necessita ser analisado, ela também é o símbolo da cidade de Deus e de sua futura noiva (Ap 21:2). O missiólogo Greenway afirma “Jerusalém simboliza a paz de Deus, unidade e Justiça. Em Jerusalém o Messias é o Rei”. Sabedores deste papel escatológico e simbólico, o qual abordaremos com mais detalhes adiante, nossa ênfase aqui recai sobre a inquestionável proeminência inicial da cidade de Jerusalém, na primeira metade do livro de Atos. Os apóstolos demoraram a entender a necessidade de se dirigirem à outras cidades, mesmo depois de instalada a perseguição aos cristãos (At. 8:1). Talvez por isto, Jerusalém seja vista como a cidade central do cristianismo nos seus primórdios. Até nos itinerários traçado por Paulo para suas viagens missionárias, no início ou no final de suas viagens, Jerusalém foi incluía. Assim sendo, é de Jerusalém que o evangelho se irradia, discípulos se espalham pelas cidades da Judéia (At 8:2). As cidades começam a ser confrontadas pelo poder de Cristo (At 8:9-12,25). O evangelho não é mais um assunto interno de Jerusalém, mas de muitas vilas e cidades, Samaria não apenas ouve, mas se converte e se alegra (At 8:4-8). Deus estava inaugurando o seu Reino urbano.
2.4.Missões Atingem as cidades do Império: De acordo com Michael Green, as viagens missionárias de Paulo se estabeleceram lançando mão de um roteiro estratégico elípitico crescente, onde um foco era a cidade de Jerusalém e o outro a cidade de Roma. Desta forma, sempre ampliando o raio de ação, cada nova viagem atingiria mais cidades do império. E fato inconteste que o Espirito de Deus orientou o apóstolo a traçar a sua rota missionária urbana, chegando até a alterar as pretensões que Paulo havia estabelecido em Trôade. As vias romanas, as rotas dos navios comerciais e até cartas geográficas disponíveis na época, foram fatores facilitadores de acesso às cidades, porém Paulo e sua equipe missionária, objetivavam certos centros urbanos como bases para futuras expansões, e nunca como um fim em si mesmos. Escolhendo cidades chaves como alvo, Paulo em sua estratégia, visava atingir outras cidades que por perto ficavam. Tal é o exemplo do que ocorreu em Tessalônica (I Ts. 1:6-8), cujo testemunho se espraiou para a Acáia e Macedônia. O ministério urbano de Paulo é refletido amplamente em suas cartas, onde de todas elas, apenas quatro não são dirigidas à igrejas de cidades. Algumas epístolas possuíram um alvo circular, visando várias cidades. Este ministério urbano não é resultado unicamente do trabalho pessoal de Paulo, destaca-se, pelo menos, outras 41 pessoas, cooperadores, pastores e anfitriões que são mencionados nas cartas. Cidades como Colossos, Laodicéia, Hierápolis, são exemplo de missão urbana, fruto do trabalho liderado por Epafras e Timóteo (Cl. 4:12-13).

MOTIVAÇÕES TEOLGICAS DE PAULO PARA EVANGELIZAÇÃO DAS CIDADES
3.1. Paixão por Cristo: A primeira motivação de Paulo era proveniente de um sentimento levado a um alto grau de intensidade, de um amor ardente, de uma inclinação afetiva, de um afeto dominador, um entusiasmo muito vivo por Cristo e sua obra. Este sentimento norteava o ministério de Paulo e o impelia para que levasse adiante as Boas Novas. Podemos descobrir isso através do conteúdo de suas cartas. Para Paulo, não existia nada no céu ou na terra que nos podia separar do amor de Cristo, e por causa desse amor somos entregues à morte o dia todo (Rm 8:36-39). O que Deus preparou para esses que o amam é incomparável (1 Co 2:9).
3.2. O senhorio de Cristo: Na carta de Gálatas (2:19-20) Paulo declara que está morto para si mesmo (crucificado com Cristo), e que Cristo vive nele. Ainda, na carta aos filipenses (1:21-23) faz uma declaração impactante: o viver para ele era Cristo, portanto se morresse ele lucraria, pois estaria com o Senhor. Em 2 Tm 4:8, o apóstolo escreve a respeito da coroa que o espera, e de todos aqueles que amam a vinda do Senhor. Essa paixão, portanto, incitava o apóstolo a estar sempre no centro da vontade daquele a quem pertencia seu coração.

3.3 Convicção de seu chamado: A terceira motivação missionária do apóstolo Paulo era a profunda convicção de que ele fora chamado para ser apóstolo de Jesus Cristo pela vontade de Deus. Isso se expressa na maioria de suas epístolas, nas quais ele recorre à autoridade de seu apostolado para confirmar seu ministério (Rm 1:1, 1 Co 1:1, 2 Co 1:1, Gl 1:1, Ef 1:1, Cl 1:1, 1 Tm 1:1, 2:7; 2 Tm 1:1, 1:11; Tt 1:1). Nas epístolas de Filipenses e Filemom, escritas com Timóteo, Paulo se intitula servo (Fl 1:1) e prisioneiro de Cristo Jesus (Fm 1).Paulo se considerava um apóstolo como os outros doze que andaram com Jesus durante os três anos e meio de seu ministério terreno. Essa autoridade apostólica vinha do fato dele ter visto o Senhor Jesus em sua viagem a Damasco (1 Co 9:1), e de ser um instrumento para levar o evangelho às pessoas. Ele chega a defender seu apostolado na primeira carta aos Coríntios (10, 11, 12).Essa convicção de que fora chamado para pregar o evangelho impulsionava Paulo a continuar seu trabalho mesmo diante das muitas pressões e perseguições que sofria (Rm 1: 16-17; Fl 3:12-14; Cl 4:3; 1 Ts 2:2).

3.4. Paixão pela igreja: Por diversas vezes vemos Paulo tomando as dores de Cristo pela igreja. Podemos entender essa preocupação como um resultado do amor ardente de Paulo por Cristo. O sentimento motivador de Cristo a se entregar pela igreja era o mesmo que Paulo tinha por ele. A entrega, portanto era bilateral: Cristo se entregou pela igreja, e Paulo se entregou por ele.Na sua segunda carta aos coríntios (12:15) ele mostra que estava disposto a gastar-se totalmente para o bem da igreja. Essa paixão o levava a não pensar em si, mas demonstrava uma genuína solicitude sob aqueles que ele cuidava.As suas epístolas às igrejas eram carregadas de uma preocupação abnegada por tudo o que acontecia dentro dessas comunidades. Ele considerava-os seus filhos, e por isso exortava quando era preciso. Um exemplo muito claro disso é da igreja de Corinto. Essa comunidade foi fundada por Paulo durante a sua segunda viagem missionária. O que gerou a composição de 1 Coríntios foram uma resposta de uma carta enviada pelos próprios coríntios (7:1), e as notícias perturbadoras à respeito da situação da igreja (1:11). Paulo trata dos problemas que incluíam divisões na igreja, imoralidade, e perguntas a respeito de diversas questões. Alguns textos mostram a preocupação e a afeição de Paulo com as comunidades cristãs provenientes de uma grande paixão: 2 Co 6:13; Ef 3:1; Fl 1:3-5, 4:1-4; Cl 1:3-10, 1 Ts 1:2-10, 5: 12-27; 2 Ts 1:11-12, 3:6-15.

3.5. Anunciar a Cristo para os gentios: Outra motivação missionária que constrangia Paulo era a visão que ele tinha de que o mundo necessitava das Boas Novas. Em 1 Tm 2:4, ele diz que o desejo de Deus é que todos as pessoas cheguem ao pleno conhecimento da verdade; e esse era também um desejo do próprio Paulo. Segundo Lopes , o alvo de Paulo era o mundo, os gentios, o remanescente fiel, o maior número possível de eleitos, onde os pudesse encontrar. Essa visão, impossível de ser medida em números, fazia parte da motivação de Paulo em sair plantando igrejas ao longo de seu ministério.Ele almejava ganhar o maior número de pessoas (1 Co 9:9), porque entendia a real necessidade do mundo em conhecer a Deus. Em Atenas, ele chega a se comover por ver as pessoas presas pelo pecado (At 17:16). Em Filipos, ele liberta uma moça possessa de um espírito adivinhador, indignado com a exploração que os donos dela realizavam (At 16:16-18). Isso mostra a grande compaixão que ele tinha com as pessoas.

ESTRATEGIAS EVANGELISTICAS DE PAULO PARA A EVANGELIAZAÇÃO DAS CIDADES
4.1. Antioquia a base da missão: Antioquia da Síria é a mais importante cidade da história primitiva do cristianismo, depois de Jerusalém. Nessa cidade foi estabelecida a primeira igreja gentílica (At 11:20-21), e foi ali também, que pela primeira vez, se chamaram cristãos os discípulos de Jesus Cristo (At 11:26). A igreja foi fundada por cristãos que tiveram que sair de Jerusalém após a morte de Estevão. Os apóstolos, vendo que o trabalho prosperava naquele lugar, enviaram Barnabé para ajudá-los (At 11:22). Paulo, depois da fuga cinematográfica de Damasco (At 9:25), é enviado para Jerusalém, Cesaréia de depois para Tarso. Barnabé, um dos primeiros de Jerusalém a crer na conversão de Paulo, vai buscá-lo em Tarso e leva-o para Antioquia para auxiliá-lo na tarefa de ensinar a igreja (At 11:25-26). Em Atos 13, há o comissionamento dos dois pela igreja para obra missionária.

Depois da primeira e segunda viagens missionárias, Paulo retorna à igreja que o havia enviado pra relatar tudo o que tinha feito no tempo que ficou fora (At 14:26-27; 18:22-23). Já na terceira viagem missionária, Paulo é preso em Jerusalém, mas podemos entender que assim como aconteceu com as duas primeiras, seu desejo era de relatar aos irmãos o que havia acontecido nessa viagem. Paulo considerava isso importante estratégia em seu ministério. Sua ligação com a igreja de Antioquia era grande. A sua “casa” oferecia apoio espiritual e moral (At 13:3). A questão financeira, muito embora não apareça explicita dessa forma, provavelmente existia, pois o apóstolo viajava com o aval da referida comunidade.

4.2. Implantação da igreja em lugar estratégico: Paulo foi um plantador de novas igrejas. Entretanto, Paulo não plantou igrejas por todo canto que passou, mas escolhia a dedo quais cidades valiam a pena este investimento. Aparentemente, Paulo parecia não querer perder tempo com cidades menos importantes. Ele escolhia cuidadosamente centros estratégicos e planejava como seria a proclamação da mensagem de salvação. Ele fez isso em cidades importantes como Listra, Antioquia da Pisídia , Filipos , Tessalônica , Atenas , Corinto , Éfeso e Roma, a principal cidade de todo império. Não há dúvida de que uma das estratégias da missão de Paulo era os centros urbanos. Paulo escolhia as cidades mais urbanizadas, influentes e estratégicas a partir das quais as boas novas do Reino poderiam se espalhar. As cidades que Paulo entrou eram centros de administração romana, sob a influência grega e judaica, além de serem importantes centros culturais, sociais e comerciais. Quando passava pelos centros romanos, procurava proteção legal do governo e ainda usava um modo de influenciá-los para a aceitação do evangelho. Segundo Nicodemus Lopes , Paulo centralizou suas atividades em importantes centros urbanos, considerado por ele estratégicos. A cidade de Tessalônica tornou-se a base missionária para a província da Macedônia; Corinto a base para a província da Acaia; e Éfeso, a sua base para a Ásia proconsular.

4.3. A contextualização missiologicas: Entendendo essa ser, numa situação de comunicação, características extralingüísticas que determinam a produção lingüística, como, por exemplo, o grau de formalidade ou de intimidade entre os falantes. A estratégia missionária paulina era determinada pela necessidade e pelo contexto local que o apóstolo se encontrava. Paulo precisava se contextualizar com seus três públicos-alvo: judaico, romano e grego. É interessante notar que enquanto estava na cidade, ele analisava o novo ambiente, procurando descobrir elementos-chave que criariam pontes para a evangelização local. Podemos notar isso em Antioquia da Pisídia, quando ele foi num sábado à sinagoga, pressupondo-se que já estava observando a cidade há algum tempo (At 13:14); em Filipos, quando permaneceu alguns dias inseridos no contexto local antes de ir num sábado à sinagoga para pregar (At 16:12-13); em Atenas, enquanto esperava seus companheiros, investigava toda a cidade e se revoltava com a idolatria, motivo que o impelia a pregar na sinagoga e na praça (At 17:16). Depois essa investigação se tornou preciosa quando pregava no Aerópago (At 17:22-23). Paulo estabelecia também um contato conveniente com as sinagogas das cidades onde passava. Como era conhecido pelo povo judeu como um aluno do mestre Gamaliel e como a base do cristianismo é o judaísmo, Paulo utilizava desses recursos para pregar a Palavra de Deus nas sinagogas dessas cidades, persuadindo judeus e constituindo assim um elo entre a antiga e a nova religião. As estratégias de Paulo ultrapassavam as paredes da sinagoga e iam de encontro à sociedade daquela época.

4.4. Formações de lideranças: Contudo, Paulo não parou por aí. Além de fundar novas comunidades, ele não deseja abandoná-las. Por isso ele trabalhava na formação de uma liderança que poderia substituí-lo quando fosse embora. Como seu ministério era um constante movimento, ele achou melhor discipular pessoas escolhidas por ele mesmo para serem os líderes dessas comunidades na sua ausência.À medida que Paulo pregavam o evangelho e discipulava novos líderes locais para a continuidade do trabalho, a comunidade local se fortalecia.Exemplos assim são vistos com Priscila e Áquila, Timóteo, Silas, Barnabé e Tito, todos preparados por Paulo que assumiram funções de dirigir diversas comunidades pela Ásia e Europa. É de se notar que os seus discípulos seguiram os seus passos nessa formação de liderança. Priscila e Áquila tomaram Apolo consigo e expôs o caminho de Deus (At 18:23-26), que se tornou depois líder da igreja de Corinto (1 Co 3:3-6).

4.5. Pregação no poder do Espirito Santo: Uma marca peculiar da estratégia de missão de Paulo foi a pregação do Evangelho no poder do Espírito Santo. Paulo estava disposto a levar o evangelho por onde quer que fosse em toda sua integridade, embora fosse condenado e perseguido por isso. Em Éfeso, ele abre o coração para os presbíteros da igreja e revela as perseguições provenientes de anunciar e ensinar o evangelho (At 20:17-38). Em Roma, quando estava preso por causa da Nova Doutrina numa casa que alugara e esperando julgamento, não cessava de pregar e ensinar (At 28:30-31). Contudo, a base para Paulo fazer isso era o próprio Espírito Santo. O apóstolo estava cheio do Espírito (At 13:9, 52; 19:2-6), e realizava toda obra no Seu poder. Foi o próprio Espírito que o vocacionou para a tarefa missionária (At 13:2), o enviou (13:4), o capacitou (13:9), o sustentou (13:52). Deus, através de seu Espírito, cuidava (At 20:23) e direcionava todo o ministério de Paulo, guiando-o a ponto de dizer onde pregar ou não (At 16:6-7).

Sergio Ribeiro é formando no Médio em Teologia pelo (ISBL) Instituto Bíblico de Londrina. Bacharel em Teologia pela (FTSA) Faculdade Teológica Sul Americana. Mestrando Teologia e História pela (FTSA). Presbítero da (IADELON) Igreja Evangélica Assembléia de Deus de Londrina, templo central. Ministro do Evangelho de Cristo, autor e organizador do site www.razaoefe.clickcblog.com.br.

SERGIO RIBEIRO

razaoefe@yahoo.com.br

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ÁS LÓGICAS DA CIDADE

Junho 12th, 2007

TEOLOGIA DA MISSÃO URBANA - ÁS LÓGICAS DA CIDADE

SERGIO RIBEIRO

“O mundo começou em um jardim, mas vai terminar em uma cidade” Haver Croc. Aí estão os dados estatísticos. O Brasil já caminha para uma população 79 por cento urbana. A Igreja rural tende a desaparecer. É verdade que os arquétipos rurais, o imaginário agrário acompanham ainda muitas pessoas da primeira geração que migrou para as cidades. Pouco a pouco, os nascidos no mundo urbano criam novo horizonte de pensar e de agir. A teologia e a pastoral não podem desconhecer tais mudanças. Desafia-nos construir uma matriz teológica urbana que responda a perguntas diferentes. O Cristianismo em seus primórdios proliferou antes em áreas urbanas. Tem uma conaturalidade com esse mundo. Sua ruralização veio depois. E impregnou-o de tal modo que hoje nos parece difícil pensá-lo fora desse paradigma. A teologia da cidade continua ainda mais um desejo que uma realidade, mais um programa que uma realização, mais uma proposta que um fato. Tem sido mais trabalhada pela pastoral e menos pela sistemática. Talvez porque não apareça claramente sua identidade. A cidade atual e a modernidade confundem-se sob muitos aspectos. Modernização — a modernidade tecnológica — e urbanização massiva caminharam juntas. É a cidade batida pela modernidade e modernização que nos interessa nesse estudo. Assim as respostas teológicas para a modernidade servem, em parte, para o fenômeno urbano. Freqüentemente no texto não distinguimos a discussão com a cidade e com a modernidade.
A teologia da cidade pode considerá-la como objeto de sua reflexão. Nessa perspectiva, existe a clássica obra de J. Comblin1. Estuda-se o embate teórico da Palavra de Deus com as cidades, seus habitantes, perguntando-se pelas razões tanto do simbolismo sagrado de Jerusalém — apesar também das invectivas proféticas contra Jerusalém — como do diabólico de Babilônia, Sodoma, Gomorra. No Novo Testamento e na Tradição eclesial, podem-se colher elementos teológicos que iluminam a fé cristã vivida na cidade. Como toda teologia predominantemente positiva, ela enriquece a compreensão da cidade com elementos da Escritura e Tradição. Tende à abundância e menos ao confronto de interpretação entre cidade e revelação. No final, sabe-se muito do que se disse teologicamente sobre a cidade. Esta realidade se ilumina com dados da Revelação para além dos conhecimentos sociológicos e outros.
O objeto-chave de captação do dado revelado, a cidade se transforma em lugar de criação teológica. Assume um papel heurístico de ajudar-nos a descobrir novas percepções da fé. E, por sua vez, a fé contribui para entender a cidade à sua luz. A reflexão se desenvolve em três momentos. Num primeiro momento, elabora-se uma fenomenologia da cidade. Em seguida, nos dois momentos seguintes, estabelece-se um círculo hermenêutico completo entre fé e cidade. Com a ótica dessa compreensão fenomenológica da cidade reflete-se sobre a fé cristã vivida numa cidade. E, com essa percepção da fé, busca-se uma melhor compreensão da cidade.Iniciar a análise com a cidade é reconhecer-lhe uma autonomia que pode ser articulada com a fé. Autonomia não significa independência total, mas ter regras próprias em seu ser. E por isso precisam ser respeitadas. “Pois é preciso reconhecer que a cidade terrena, a quem são confiados os cuidados temporais, se rege por princípios próprios. Mas com razão deve ser rejeitada aquela infausta doutrina que intenta construir uma sociedade prescindindo totalmente da religião e ataca e destrói a liberdade religiosa dos cidadãos.”2
A cidade permite muitas aproximações teóricas. Iluminador seria um estudo histórico das cidades, acompanhando-lhes o nascer e o morrer. As duas capitais do Egito antigo, Mênfis e Tebas, sofreram os ataques destruidores dos assírios (séc. VIII a.C.) e dos babilônios (séc. VII a.C.). A própria cidade de Jericó permite hoje ver em suas ruínas a sucessão de cidades. Jerusalém também conheceu destruições (Nabucodonosor, Tito) e reerguimentos. Além dos assírios e babilônios, grandes destruidores de cidades, os romanos também devastaram Cartago, Cápua, Corinto, Tróia e tantas outras cidades. A Bíblia descreve Sodoma e Gomorra desaparecendo envolvidas pela chuva de enxofre e fogo (Gn 19,23-29). Nossas Américas conheceram também as cidades esplendorosas de Tenochtitlan e Cuzco, que os conquistadores arrasaram, deixando-nos ver até hoje seus destroços. Nossa viagem histórica poderia prolongar-se por tantos impérios e séculos, levantando as memórias de cidades totalmente destruídas ou hoje existentes sobre ruínas passadas. Tal percurso nos ensinaria lições sobre elas.
Cartografando as cidades, poderíamos escolher cidades-símbolo e a partir delas penetrar algo desse movente humano de construir e destruir seus hábitats. A história nos ofereceria exemplos maravilhosos. Os nomadismos tendiam a construir cidades. Algumas cidades exprimiam na terra toda uma simbologia e façanhas de deuses e heróis. Cinco mil anos antes da era cristã, já existiam cidades na Suméria, região da Baixa Mesopotâmia. As mais antigas civilizações nasceram às margens de um rio. O Tigre e o Eufrates — Mesopotâmia — viram florescer a Suméria, Babilônia, Nínive, Assur; o rio Nilo banhou Mênfis e Tebas. E a figura dos rios vestia-se de divindade. O Eufrates era de tal modo divinizado que era proibido cuspir e urinar. Outras cidades foram construídas em torno das sepulturas do rei-deus, como Tebas e Mênfis. Outras remontam a visões mágicas e espiritualistas da realidade, como no vale do rio Hindus. Outras refletem a associação do senhor e do comerciante. Outras traduzem a civilização rural. No mundo grego, a cidade se vincula à cidadania laica. A divinização já não é do monarca, mas da própria cidade. E assim poderíamos ir multiplicando as cidades-exemplo: do lazer, do comércio, das instituições de Igreja (convento, catedral, matriz), do Renascimento opulento, do triunfo do príncipe, da deusa Razão, do capitalismo, da utopia socialista, da cidade-máquina, dos futurólogos etc. 4
“Se quisermos lançar novos alicerces para a vida urbana, cumpre-nos compreender a natureza histórica da cidade e distinguir entre suas funções originais aquelas que dela emergiram e aquelas que podem ser ainda invocadas. Sem uma longa carreira de saída pela História, não teremos a velocidade necessária, em nosso próprio consciente, para empreender um salto suficientemente ousado em direção ao futuro, pois grande parte dos nossos atuais planos, sem exceção de muitos daqueles que se orgulham de ser ‘avançados’ ou ‘progressistas’, constituem pouco engraçadas caricaturas mecânicas das formas urbanas e regionais que ora se acham potencialmente ao nosso alcance.” Detendo-se na cidade de hoje, em sua diversidade de tamanho e geografias, é possível detectar os problemas comuns à fé cristã. Depois de elencá-los, a reflexão teológico-pastoral poderia ir buscando respostas. É o caminho mais comum da teologia da cidade. Aí estão tantas obras de pastoral urbana. Inspirando-nos nesse último modelo, buscaremos analisar a cidade a partir de suas lógicas internas. A preocupação é didática. Quando se vive numa cidade, seguem-se suas regras, suas lógicas, seus cânones. Se se desvendam tais lógicas, mais facilmente consegue-se viver nela de maneira consciente e livre. Deixar-se levar pelo caudal urbano de maneira inexorável gera a sensação de impotência. E contra ela temos a consciência crítica que nos dá os limites do navegar na correnteza e a eventual necessidade de remar contra em termos éticos e de fé.
A análise da cidade se organizam em torno de eixos. Os eixos multiplicam-se à medida que consideramos a cidade detidamente. Em dado momento cabe dar-se por satisfeito, deixando o trabalho aberto para ulteriores prolongações. O método defronta-se com empecilhos. Que eixos escolher? Quantos? Toda escolha goza de certo arbítrio. Sua validez depende tanto da relevância evidente do eixo escolhido como de sua justificativa teórica. O critério da relevância varia conforme as perspectivas assumidas. Tudo isso necessita passar por um mínimo de criticidade. Uma definida fenomenologia da cidade faz parte do método hermenêutico, que é a base teórica fundamental. Embora depois da virada hermenêutica ele tenha adquirido robusta cidadania teórica, sempre é bom explicitá-lo e confrontá-lo com outras possibilidades teóricas em suas vantagens e em seus limites.

A HISTÓRIA DA MISSÃO

Junho 12th, 2007

A HISTÓRIA DA MISSÃO

ROBSON D. J.BARBOSA

Observamos a “Historia da Missão” como um processo que apresentou altos e baixos, acertos e desacertos, vitórias e derrotas. Vemos neste processo histórico, homens dignos de serem imitados, como também, homens que usaram da igreja como um simples palco para a realização de seus mais inescrupulosos desejos. Começamos a analisar um sonho que Deus arquitetou começar da forma mais pura e humilde, para depois se tornar em uma triste realidade onde a igreja se transforma, se corrompendo a tal ponto que passa a se tornar o centro do poder autoritário e opressor como também da luxuria e regalias. Porém, este sonho e projeto não ficaram para sempre perdidos nas mãos de homens inescrupulosos, pois Deus em Sua infinita soberania levanta homens que não se dobraram a vergonha e não negaram a verdade. Realizando a maior reforma eclesiástica, trazendo valores e verdades que haviam sido esquecidas no decorrer da caminhada, fazendo com que a igreja voltasse aonde caio e retomasse de onde havia parado. Foi este processo de altos e baixos que a Historia da Missão enfrentou, resistindo a todos os tipos de ideologias e varias épocas de mudanças, para que hoje ela fosse um meio de anúncio das Boas Novas da Salvação a todos os povos, levando na sua essência a vida do próprio Deus na imagem de Seu Filho Jesus Cristo.
O nascimento das missões não ocorre no inicio da formação da igreja no advento do Pentecostes, mas sim na promessa de Deus em resgatar o homem do seu estado pecaminoso (Gn 3:15). E o seu cumprimento ocorre no envio de Jesus ao mundo com a finalidade de salvar a humanidade da condenação eterna; este foi o ponto auge das missões (Jo 3:16).
Com a ordem de Jesus à Grande Comissão inicia-se a importante tarefa da futura igreja de transmitir a “Vida” a todos os povos e em todas as nações. Os primeiros anos da igreja foi caracterizado pelas perseguições a uma classe humilde que tinha como objetivo de vida propagar a mensagem que os havia salvado. Eles não só anunciavam as Boas Novas, mas eles viviam elas, marcando profundamente a sociedade onde estavam. Tinham em seus corações a volta iminente de Cristo o que fazia com que não se apegassem a bens materiais e por isso vendiam e distribuíam para que todos pudessem compartilhar uma vida em comum. (At 2:42-47).
Porém, passado trezentos anos, o imperador Constantino se converte ao cristianismo e une a igreja ao Estado. Neste momento o cristianismo deixa de ser um movimento pra se tornar uma instituição. A questão da iminência de Cristo se perde e a igreja que antes tinha um caráter comunitário e humilde passa a se tornar individualista e elitisada. A igreja deixa de ser perseguida para se tornar perseguidora. A uma mudança radical de estilo e ética dentro do mundo eclesiástico. Como o Estado estava unido a igreja, logo os interesses políticos e econômicos passam a ser os regentes desta instituição que agora inicia a sua queda moral e espiritual. Neste período as missões estão restritas apenas a igreja. É neste contexto que surge os monastérios como forma de repulsa a esta instituição decadente e imoral.
Mas o auge da decadência ocorreu na idade media onde todos os tipos de fetiches eram comercializados, como também a salvação passa a ser exclusivamente através da igreja, fazendo com que ela até venda a salvação através das indulgências. Com o início das cruzadas e das colonizações passa-se a difundir mais o cristianismo a outros lugares e povos, porém de forma imposta através da força. Nisto começa a aparecer todo tipo de sincretismo religioso. As missões tornam-se apenas um meio de conquista de terras e subjugação de outros povos.
Em meio a esta calamidade, surgem homens que lutam para que o cristianismo volte a essência da verdade, lutando contra o sistema que estava regendo o mundo cristão. Inicia-se então a Era dos Reformadores. Tendo como o principal personagem o monge Agostiniano – Lutero. Neste momento a igreja deixa de ser una; mas a intenção primeira de Lutero não era formar uma nova igreja, mas “Reformar” a igreja Romana. O eixo de sua teoria era a justificação pela fé, onde a fé e a conversão não seriam impostas e sim obra do Espírito Santo, e que também nenhuma quantia em dinheiro ou esforço próprio daria ao homem a condição de ser salvo. A igreja começa um processo de limpeza da sujeira que havia se tornado, para voltar aos princípios bíblicos que deveriam sempre ter sido à base da vida cristã. Lutero traduz a Bíblia para o Alemão, para que todos pudessem ler e ter acesso as Escrituras. A missão nesta época não foi muito significativa pelo fato dos reformadores estarem preocupados primeiramente em formar uma teologia fundamentada nos preceitos Bíblicos, mas não podemos negar que esta iniciativa dos reformadores como Lutero, Calvino e outros, foi a base para as missões modernas. Mesmo que esta época não tenha sido um marco na questão de missões, ela foi a responsável para a mudança de paradigma que levou enfim a igreja a se mobilizar e dar um grande salto para a realização das missões.
Surge assim a época em que chamamos de ‘Era do Despertamentos’ no inicio do século XVII, movidos pela luta dos reformadores e incentivados pela sede da Palavra. Nasce vários movimento como o puritanismo, pietismo, os morávios entre outros que realizaram uma revolução no conceito de missões causando um grande avivamento em vários lugares, levando valores morais e cíveis, aonde a transformação não vinha apenas do individuo, mas de toda a sociedade. Levando-nos a concluir que avivamento não pode ser resumido apenas como conversão de indivíduos, mas deve ser seguida de transformação na sociedade. Mostrando assim que a igreja deve fazer diferença no contexto onde está inserida.
Todos estes movimentos geraram no século XIX o maior século missionário devido ao contexto da época. Aparecem novos heróis da fé cristã que deram a sua vida pra que o evangelho fosse conhecido em vários povos não alcançados. Homens como William Carey, Hudson Taylor, David Livingstone, John Paton são alguns desses missionários que foram e ainda são fontes de inspiração a todos nós e a toda a igreja.
O século XX também foi um período de grande avanço missionário, onde as mulheres tiveram maior liberdade para fazer missões, e movimentos estudantis começaram a se despontar como grandes propagadores da fé cristã. O período das duas grandes guerras mundiais deixou marcas e dificultou o avanço do evangelho, mas após elas, a propagação tomou o seu crescimento anterior. Este século se caracterizou pelos congressos missionários, pelas uniões das igrejas na questão da importância de missões tendo um grande numero de pessoas que aceitaram o chamado divino e se dirigiram as mais remotas partes do planeta com a finalidade de levar as Boas Novas do Evangelho.
E o Brasil, sendo colonizado por países católicos, foi catequizado a força surgindo um sincretismo que vemos na nossa cultura até os nossos dias. Mas com a vinda de missionários americanos, escoceses, suecos e ingleses a igreja começou a criar força no decorrer do tempo, sendo que hoje ele é considerado um celeiro de missões sendo o responsável por grande numero de missionários enviados a todos os campos do mundo. Desejamos que o nosso país seja marcado e lembrado como a nação missionária e visionaria de um mundo transformado e marcado pela cruz de Cristo. Esta missão e esta visão devem ser de todos nós que desejamos ver vidas transformadas e uma sociedade moldada pelas verdades da Palavra

TEOLOGIA DO CULTO I

Junho 12th, 2007

TEOLOGIA DO CULTO I

LUIZ NATUREZA

Muitas vezes, as pessoas se perguntam por quê existem. Para quê fomos criados? A Bíblia nos mostra que existimos para o louvor e glória de Deus. Sendo este um fato espiritual, é natural concluirmos que o culto está vinculado à nossa natureza. Nascemos com um “instinto cultual”. Tal afirmativa é endossada pelos historiadores, antropólogos e arqueólogos. Em todas as civilizações de todos os tempos, encontra-se presente o fenômeno chamado “culto”. O culto é a expressão da fé. É o tributo de honra, louvor e serviço àquele que se venera. Quem é “aquele” ? Bem… nesse ponto as civilizações não se entendem. Os alvos do culto humano têm sido os mais diversos possíveis. Há quem adore o sol, a lua, as estrelas, os rios, os animais. Outros veneram o seu semelhante, vivo ou morto, ou imagens de sua própria criação. Mais longe vão os que espiritualizam o culto : adoram espíritos que são identificados por centenas ou milhares de nomes. Em muitos povos foi constatada também a adoração a um “ser supremo”, criador de todas as coisas. Provavelmente, tais pessoas tiveram algum tipo de experiência espiritual genuína. Entretanto, é através do povo de Israel que o criador se apresentou à humanidade. Jesus disse : “Vós adorais o que não sabeis. Nós adoramos o que sabemos, porque a salvação vem dos judeus”. (João 4:22). Aleluia ! Aí está aquele que deve ser o alvo de culto de todo ser humano: o Deus de Abraão, de Isaque e de Jacó. Os judeus são o nosso ponto de referência religiosa na história. Portanto, convém que nos dediquemos a conhecer aspectos do seu culto que nos serão de grande utilidade no entendimento de nossas práticas atuais. Enquanto muitos se perdem em cultos vãos, adorando ao que não se deve, a Bíblia nos mostra que Deus está à procura de verdadeiros adoradores. Antes de buscar pregadores, intercessores, evangelistas, etc, o Senhor procura pessoas que se dediquem a cultuá-lo. O culto a Deus está fundamentado no conhecimento que se tem dele. À medida em que o conhecemos, o adoramos. O verdadeiro culto é um relacionamento purificador e transformador com o Pai, o Filho e o Espírito Santo.Que o Senhor nos ajude a encontrar as diretrizes do culto que o agrada. Esta questão é a principal. Normalmente, temos o hábito de fazer avaliações dos cultos em que participamos. Depois dizemos : “Não gostei do culto hoje”, ou , “fiquei muito satisfeito com o culto”. Falamos como se o culto fosse dirigido a nós. Deus nos livre de usurparmos a glória que lhe é devida. Que ele nos abençoe e que possamos ser encontrados como aqueles que adoram ao Pai em espírito e em verdade.
1.1. A ESSÊNCIA DO CULTO BÍBLICO: Haverá, em meio às múltiplas maneiras de cultuar, um sine qua non na adoração, um elemento que seja imprescindível? Cremos firmemente que há. Jesus reafirmou o que Moisés, no Antigo Testamento, deixou claro: o primeiro mandamento exige um amor a Deus, sem limites (Dt.6:4,5). Séculos depois que Deuteronômio foi escrito, um intérprete da lei levantou esta pergunta para Jesus: “Qual é o grande mandamento da lei?” Respondeu o Mestre: “Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento”(Mt. 22:36-37). No texto original de Deuteronômio, encontramos a palavra “força” em lugar de “entendimento”. O texto de Marcos (12:30) transcreve ambos, “entendimento” e “força”, na resposta de Jesus. O cristão, cuja mente e coração estão voltados para o Criador e Pai Eterno, percebe nestas palavras de Jesus um verdadeiro desafio, pois nelas estão a raiz, o tronco e o fruto da adoração. Sem o incentivo do amor por Deus, o culto não passa de palha, pura “casca”, isento de qualquer valor. Pode até se tornar em culto a Satanás. Uma adoração que se realiza sem o objetivo de expressar e aumentar nosso amor por aquele “de quem, e por meio de quem e para quem, são todas as coisas” (Rm.11:36), falha completamente. Deixa de ser culto a Deus, pois carece da essência, que é o amor. Ora, quando se trata de amor por pessoas amigas ou entes queridos da família, não encontramos dificuldades em atender o sentido de amar. Mas, como se há de amar a Deus, a quem “ninguém jamais viu”? (Jo.1:18) Como havemos de colocar o Senhor no centro de nossas ambições? Ou, como nutriremos a amizade que venhamos a oferecer a Deus, sendo nós pecadores, enquanto Ele é Espírito infinito e mora em luz inacessível? Como faremos de Deus o “Senhor absoluto” de nossa existência? Os cristãos, reunidos em adoração a Deus, devem ter este objetivo como prioritário.
1.2. Culto verdadeiro requer amor de todo o coração: Para o hebreu, o coração, no sentido metafórico, representava o centro da vida intelectual e espiritual. Associando-se de perto com a alma, o leitor original de Deuteronômio teria pensado em seus sentimentos, suas avaliações, sua vontade, todos emanando do coração. Esta realidade pessoal emite emoções tais como alegria, pesar, tranqüilidade e ansiedade. Igualmente alcança as áreas intelectuais tais como compreensão e conhecimento, e exerce o poder de raciocinar ou lembrar. Diríamos, enfim, que coração e alma representam o homem interior como um todo. Em seu coração o homem é responsável diante de Deus, em todos os seus atos e palavras. Somente um coração inclinado para Deus é capaz de adorá-lo, agradá-lo e amá-lo.Tanto no Antigo Testamento como no Novo Testamento, o amor que há no coração é o alvo da busca de Deus. Ele se dirige ao coração porque ali está a sede do amor. Prof. Bruce Waltke, do Regent College, no Canadá, lembra-nos que antes de o Senhor mandar seu povo buscá-lo unicamente no lugar onde Ele estabeleceria seu nome (Dt.12), Deus, em seis capítulos antecedentes (Dt. 6-11), exorta os israelitas a darem-se a si mesmos inteiramente ao Senhor. “Circuncidai, pois, o vosso coração” (Dt. 10:16). Pois é no coração que o Todo-poderoso toca, ao fazer contato conosco, “… aquela parte do homem … onde, em primeira instância, se decide a questão pró ou contra Deus” (Gutbrod).
Por ser o coração essencialmente espiritual, mantendo o que resta da imagem de Deus no homem caído, é possível amar àquele que não tem corpo físico e nem existe ao alcance dos nossos cinco sentidos? Evidentemente, para amarmos a Deus, precisamos crer que Ele se revelou através de palavras por Ele inspiradas (II Tim. 3:16), e uma vez recebidas pelos profetas, homens por Ele escolhidos, estes fizeram seus devidos registros. Contudo, sua revelação não se limita à transmissão de conceitos comunicáveis por linguagem humana. Inclui atos que claramente evidenciam seu amor e paciência para com seres que têm negligenciado e ignorado as evidências do seu profundo interesse por eles. Inclui convicção criada por Deus no coração que ele decide abrir (At.16:14), para fazer brilhar a luz de sua personalidade (II Cor. 4:4,6). Resulta no reconhecimento do testemunho do Espírito Santo de Deus “com o nosso espírito que somos filhos de Deus” (Rm.8:16).Enquanto Deus revela a si mesmo no íntimo do coração pela Palavra lida e recebida, pelo reconhecimento de sua ação no mundo e pela comunicação pessoal do Espírito residente, nós devemos responder em adoração a ele que declara e aprofunda nosso amor.Uma moça presa numa casa em chamas foi resgatada por um jovem bombeiro que pôs sua própria vida em risco para retirá-la do incêndio. Ela sentiu profunda responsabilidade de agradecer-lhe o ato sacrificial. Poucos dias depois, a jovem, que foi resgatada, procurou o bombeiro para externar sua gratidão. Eles conversaram, passearam, e, finalmente, acabaram se casando. Ela, que devia a vida ao jovem bombeiro, passou a namorá-lo e, lentamente, um mero sentimento de gratidão transformou-se num amor profundo. Pagou uma dívida de vida com a oferta permanente do seu amor e mostrou sua alegria em conviver com aquele que arriscou sua vida para lhe resgatar.
Assim Deus procura uma comunhão por meio da experiência verdadeira com cada pessoa que experimentou passar da morte para a vida (Jo.5:24), pelo sacrifício de Jesus Cristo. O novo adorador começa com um sentimento de obrigação de servir a Deus no culto; vai aprendendo a amá-lo e progride até que todo o seu coração se concentre na beleza da pessoa do Senhor: “Eis que Deus é a minha salvação; confiarei e não temerei, porque o Senhor Deus é a minha força e o meu cântico… vós com alegria tirareis água das fontes da salvação” (Is.12:2,3). Davi, no deserto de Judá, disse: “Ó Deus, tu és meu Deus forte, eu te busco ansiosamente; a minha alma tem sede de ti” (Sl. 63:1). Desse modo se expressaram os que, na Antiga aliança, amavam a Deus.É natural, para quem experimentou a “graça melhor do que a vida” (Sl. 63:3), descobrir um eco semelhante no seu coração. Agostinho afirmou, acertadamente, nas linhas bem conhecidas que deixou para a posteridade: “O homem mantém-se agitado até encontrar seu descanso em Deus”.O evangelho é deveras uma posição doutrinária, mas antes é um relacionamento do cristão com Deus. “Se alguém me ama, guardará a minha palavra; e meu Pai o amará, e viremos para ele e faremos nele morada” (Jo. 14:23). “E nós o amamos porque ele nos amou primeiro” (I Jo.4:19). Porque na realidade, “cada indivíduo dá seu coração àquilo que considera de máxima importância, e esta lealdade determina a direção e o conteúdo da sua vida”.
O general William Booth, fundador do Exército da Salvação, foi indagado acerca do segredo do seu sucesso. Hesitou um instante e, com os olhos cheios de lágrimas, respondeu: “Eu compartilharei o segredo. Deus tem se apoderado de tudo que há em mim. Podem ter havido homens com maiores oportunidades, mas desde o dia em que os pobres de Londres dominaram meu coração e ganhei uma visão daquilo que Jesus Cristo podia fazer, determinei que Deus teria tudo do que houvesse em William Booth. Se há algum poder no Exército da Salvação, hoje, é porque Deus tem recebido toda a adoração do meu coração, todo o poder da minha vontade e toda a influência da minha vida.Concluímos que Deus nos quer como seus verdadeiros adoradores, por nos amar profundamente ( I Jo. 4:8/16) . Seu mandamento singular requer que nós o amemos de todo o coração e alma. Participar em todo e qualquer culto requer primeiramente uma melhor aproximação dele em amor. Assim, a adoração da igreja cumprirá seu objetivo se :
 O louvor focalizar sua dignidade, a beleza da sua pessoa e a perfeição do seus caráter. Deve, ainda, convidar todo homem a atribuir glória ao Pai maravilhoso (Sl. 46:10);
 A confissão do pecado que cometemos externar o reconhecimento da nossa indignidade e declarar nosso arrependimento pela rebelião contra a expressa vontade de Deus. Também, não deixa de ser um estímulo forte de amor, confiar no seu imediato e imerecido perdão (I Jo.1:9);
 Nossa oração procurar assimilar seus pensamentos; expressar petições de acordo com seus conhecidos desejos. Amor genuíno funde os desejos dos que buscam o Reino e a vontade única de Deus;
 A mensagem, ouvido ou lida, suscitar pensamentos de gratidão e encorajamento. Serão veículos de transformação de inimigos em amigos que a ele buscarão agradar (Jo.15:14,15);
 A música atrair o coração para a beleza de Deus revelada na criação, na redenção e na regeneração, refletindo assim a harmonia do universo, por ele criado.
Enfim, quando adoramos, só devemos ficar satisfeitos se expressarmos o verdadeiro amor ou se nosso culto revelar toda a preciosidade do Senhor, infundindo-a nos participantes.
Certamente, reconhecemos que nunca alcançaremos um amor perfeito por Deus, à altura do amor que ele tem por nós, seus filhos. Se, como a Pedro, ele nos perguntasse: “Amas-me mais do que estes?” (Jo.21:15), estaríamos prontos a responder-lhe: “Sim, Senhor, tu sabes que te amo”, mesmo sabendo que o vocábulo da pergunta de Jesus seja agapas ( amor sacrificial decidido), em contraste com a resposta philos (amor de amizade e afeição). Amamos, mas não podemos confiar muito em nosso amor, nem nos orgulhar por declarações petrinas. Há o risco de uma lealdade falha.

O MINISTÉRIO DIDÁTICO, POLÍTÍCO E SOCIAL DA IGREJA

Junho 12th, 2007

O MINISTÉRIO DIDÁTICO, POLÍTÍCO E SOCIAL DA IGREJA

Sergio Ribeiro

Didático: Esse ministério da Igreja era para ser exercido através dos seus pastores e mestres. Consistia na instrução pública e particular, através de sermões e orientação individual, quanto ao ensino bíblico sobre a administração dos bens outorgados por Deus ao Estado e ao indivíduo. Em outras palavras, Mordomia Cristã.Tomemos como exemplo a questão do trabalho e descanso. De acordo com Calvino, a Igreja deveria através do ministério regular de seus pastores instruir seus membros no ensino das Escrituras sobre o assunto.
Em suas Institutas Calvino escreveu o que possivelmente foi o seu ensino em Genebra sobre o trabalho: só Deus alimenta o homem — dele vem as forças e as condições para que o homem trabalhe, e com seu suor, compre seu pão. O trabalho, portanto, é algo eminentemente digno pois é a realização da vontade de Deus para o homem. Assim, o homem não se realiza plenamente, senão no trabalho, pois foi para isto que foi criado e vocacionado, conforme está escrito em Gênesis 1 e 2. O pecado tirou a alegria e a graça que acompanhava o trabalho no início. A queda introduziu no mundo e na sociedade humana os distúrbios sociais relacionados com o trabalho (Gênesis 3). Mas, em Cristo o homem reencontra a alegria e o gosto do labor.

Quanto ao descanso, Calvino insistia que era necessário proporcionar aos trabalhadores um dia de descanso, o sábado cristão, que é o domingo, conforme sua interpretação do quarto mandamento (Êxodo 20.8-11). O descanso físico, porém, está intimamente ligado ao espiritual — sem Cristo, não há descanso verdadeiro no domingo. Assim, Calvino via a profanação do Domingo como a origem da corrupção do trabalho. Segundo ele, é necessário cessarmos dos nossos labores, como Deus cessou dos dele (He 4.3). Assim, conforme Farel já havia orientado, o Conselho de Genebra, debaixo da influência de Calvino, aboliu todos os feriados católicos e determinou que no domingo cessasse todo labor em Genebra. Através do púlpito, exercendo o seu ministério didático, a Igreja então levantava o ânimo moral do trabalhador assegurando-lhe que mesmo os trabalhos mais humildes são honrados por Deus, e que Deus assim determinou que pelo trabalho o homem encontrasse sua vocação na vida. E que em Cristo, o trabalhador encontraria a alegria e a satisfação que deveriam acompanhar o labor diário.Havia um outro aspecto do ministério didático da Igreja que consistia em repreender, através das pregações, os membros que estivessem incorrendo em pecados sociais.
Assim, os pastores de Genebra, orientados por Calvino, denunciavam do púlpito a prática da cobrança de juros excessivos por parte dos agiotas. Da mesma forma denunciavam a vadiagem. Vadiagem e parasitagem é pecado, ensinava Calvino. Para ele, quando Deus criou o homem e o ordenou cultivar a terra, condenou com este gesto a ociosidade e a indolência. Não há nada mais oposto à ordem da própria natureza do que consagrar a vida à beber, comer, e dormir, sem indagar sobre o que fazer (Sl 128.3; 2 Ts 3.10-12).Calvino também falava contra o desemprego causado pela ganância dos ricos. Privar um homem do seu trabalho é pecado contra Deus — pois trabalho é dom de Deus, e o dever que ordenou ao homem, ensinava Calvino. É tirar-lhe a vida — pois os trabalhadores pobres dependem dia a dia do seu labor para o pão com se sustentam e às suas famílias — ao contrário dos ricos, que têm propriedades, reservas, etc. Assim, promover o desemprego, na opinião de Calvino, seria um atentado à vida do pobre, e, portanto, um pecado contra o mandamento “Não matará”.Esse era o primeiro aspecto da responsabilidade social da Igreja no pensamento de Calvino, ou seja, instruir seus membros, pela pregação da Palavra, acerca dos princípios bíblicos sobre o trabalho e o descanso.

POLÍTICO: Ao lado do Estado, a Igreja tinha um outro ministério, na teologia social do reformador, a saber, o ministério político. Para entendermos melhor o que Calvino tem a dizer sobre isto, vamos primeiro entender seu pensamento sobre a relação entre a Igreja e o Estado.Podemos resumi-lo no que Calvino tem a dizer sobre Romanos 13.1-7, uma passagem o­nde o apóstolo Paulo menciona as autoridades e nossos deveres para com elas. Para Calvino, a Igreja e o Estado são duas instituições procedentes de Deus (Rm 13.1-2); são instrumentos de Deus para a vinda do Seu Reino na terra. A Igreja é as primícias deste Reino vindouro, como já vimos; o Estado, por sua vez, deve manter a ordem provisória na sociedade humana. Portanto, existem entre as duas instituições laços duráveis e essenciais, e não simples relações ocasionais.Qual a missão do Estado no pensamento de Calvino? Ainda com base em Romanos 13, Calvino sustenta que o Estado deveria manter a ordem na sociedade (conforme sua interpretação de 1 Tm 2.1-2), prover o sustento da Igreja, e promover os meios necessários para que haja a pregação fiel da Palavra de Deus entre os cidadãos. Ou seja, usando o poder civil dado por Deus, as autoridades deveriam envidar todos os esforços para que a religião verdadeira prevalecesse na terra.Porém, para Calvino isto não implica qualquer ingerência do Estado nos negócios da Igreja. O Estado faz estas coisas através de uma boa legislação que garanta a livre pregação da Palavra de Deus.
A edificação da Igreja se faz apenas pela pregação da Palavra no poder do Espírito, e não pela interferência do poder do Estado. E aqui Calvino critica os demais reformadores que desejavam uma união entre Igreja e Estado, e que o Estado tomasse conta dos negócios da Igreja (como ocorreu parcialmente na Alemanha).Se esta era a missão do Estado, qual seria a missão política da Igreja? Para Calvino, em primeiro lugar, orar pelas autoridades constituídas (1 Tm 3.1-2). E isto, em qualquer país em que os cristãos se encontrassem, independente da forma de governo daquele pais, por mais hostis que as autoridades fossem, para que se convertam e venham ao bom senso, assim como Jeremias exortou os cativos a que orassem pela Babilônia (Jr 29.7).Em segundo lugar, a Igreja deveria, quando necessário, advertir as autoridades, quando estas esquecessem o senso divino do seu ofício, quando abusassem do poder, quando cometessem injustiça, quando tolerassem injustiças contra os pobres, os fracos e os oprimidos. Se a Igreja cessar de vigiar o Estado, diz Calvino, ela se torna cúmplice da injustiça social, cessando de cumprir sua missão política.Em terceiro lugar, a Igreja também deveria, como parte de sua tarefa, tomar a defesa dos pobres e fracos contra os ricos e poderosos.
Ela deveria consistentemente alertar o Estado a que proteja os fracos, os oprimidos e explorados pelos ricos, os que não possuem poder político ou econômico, e não têm proteção social. Neste sentido, a Igreja deve sempre denunciar ao Estado, os ricos que exploram a miséria alheia em tempo de calamidade, os que tiram partido da sua situação social ou oficial para se enriquecerem e se porem a coberto. Calvino entendia que estas atitudes eram apropriadas para a Igreja pois refletiam o ensino da lei de Moisés e do ministério dos profetas, ao denunciarem a opressão social em Israel.Por fim, a Igreja deveria recorrer à autoridade do Estado na aplicação de sanções disciplinares, e solicitar do Estado as medidas necessárias para a manutenção da ordem e da justiça social. “Em resumo, o ideal reformado era este: uma Igreja politicamente livre, inteiramente dependente da Palavra de Deus, em um Estado que lhe respeite e lhe favoreça o ministério.”

SOCIAL: O outro aspecto da responsabilidade social da Igreja era a assistência social. A Igreja, segundo a teologia social de Calvino, deveria envolver-se ela mesma no cuidado dos pobres, dos órfãos e das viúvas — enfim, dos necessitados. E isto sem fazer distinção entre os da igreja e os de fora. Ou seja, a assistência social da Igreja deveria contemplar inclusive os estrangeiros e refugiados que chegavam a Genebra.O ensino de Calvino sobre este ponto é vasto. Ele trata do uso e desfruto dos bens materiais, e se dedica especialmente a expor o ensino bíblico sobre o pobre e o rico, e sobre a prática das esmolas.O órgão encarregado do ministério social da Igreja, diz Calvino, é o diaconato. Foi Calvino quem primeiro resgatou esta função bíblica do ofício diaconal.
Ele ensinou que os diáconos eram ministros eclesiásticos, encarregados de toda a assistência social da Igreja (Atos 6.1-7), e como tal, deveriam ser eleitos conforme as regras estabelecidas por Paulo em 1 Timóteo 3.8-13. Até hoje em algumas igrejas Reformadas a administração financeira da Igreja e o uso dos recursos para a assistência aos pobres e necessitados é atribuição da junta diaconal. O diaconato, como braço do ministério social da Igreja, se desenvolve em três ações básicas, segundo Calvino:
1) Administração dos bens destinados à comunidade. A igreja recebia recursos para a assistência social de duas fontes: a generosidade dos fiéis nas coletas levantadas para este fim aos domingos, e o tesouro do Estado, através do Conselho de Genebra, que votava verbas para este fim. Estes recursos eram recebidos e administrados pelos diáconos.
2) Distribuição de forma justa e igual entre os necessitados. Os diáconos cuidavam que todos os genuinamente carentes tivessem participação igual nos bens destinados aos pobres. Num ambiente marcado pela opressão social e pelas desigualdades, os diáconos certamente tinham muito trabalho a ser feito, e necessitavam de muita sabedoria para faze-lo.
3) Visitação e cuidado dos doentes. As guerras, a falta de saneamento público, as epidemias, a falta de assistência médica do Estado, e a pobreza, deixavam um saldo enorme de pessoas doentes. O ministério dos diáconos incluía o cuidado para com estas pessoas, utilizando-se quando necessário dos recursos da Igreja.É necessário observar que no pensamento de Calvino o ministério social da Igreja era de apoio ao Estado. Cabia ao governo civil cuidar dos pobres, doentes e necessitados. Mas, como se tratava de uma tarefa de enormes proporções, a Igreja vinha como apoio e auxílio, dando ela mesma assistência social o­nde necessário.

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